O PERTURBADOR “CINCO GRAÇAS” EXPÕE A HIPOCRISIA DA SOCIEDADE MACHISTA.

Por Celso Sabadin.

No final da sessão de imprensa de “Cinco Graças”, uma rápida pergunta percorreu as mentes de alguns jornalistas: em que época se passa o filme? Não era exatamente uma dúvida, já que claramente a ação é ambientada nos dias de hoje. Tratava-se mais de uma indignação, uma incredulidade: como é possível que uma situação tão medieval como a relatada em “Cinco Graças” ainda possa acontecer nos tempos atuais?

Tudo acontece num vilarejo no interior da Turquia, onde cinco irmãs (entre aproximadamente 11 e 17 anos, algo assim) decidem passear pela praia antes de voltar para casa, comemorando o último dia de aula. Lá, elas se divertem e brincam com outros colegas, como quaisquer crianças e adolescentes normais. Ao retornar à casa, o mundo das meninas desaba: uma vizinha havia “denunciado” à avó das garotas (elas são órfãs) que elas teriam vivido praticamente uma orgia com os meninos, na praia. Começa aí um calvário de intolerância, ignorância e, principalmente, hipocrisia, no qual as meninas serão obrigadas a agir como se fossem meros objetos. Casamentos arranjados, trancas nas portas, testes de virgindade e grades nas janelas serão apenas o início de um inferno que se encaminha para trágicas consequências.

A atriz turca Deniz Gamze Ergüven, aqui estreando na direção, desenvolve com maestria o clima de abismo entre dois mundos: o das garotas – alegre, cúmplice, jovem e divertido – e o dos adultos, repleto de opressão e medo. A diretora também é extremamente feliz na difícil tarefa de desenhar e desenvolver não apenas uma, mas cinco personagens principais (embora só uma seja a narradora dos fatos), além de criar com eficiência a necessária empatia das meninas com o público, sem escorregar em momento algum nem no maniqueísmo, nem na melodramaticidade simplista que o tema facilmente poderia proporcionar.

Com roteiro da própria diretora, em parceria com a francesa Alice Winocour (a mesma de “Augustine”), “Cinco Graças” tem feito carreira de sucesso em festivais internacionais e está entre o semifinalistas no Oscar de filmes estrangeiro. A produção é dividida entre Turquia, França, Qatar e Alemanha.

Só não entendi até o momento porque o titulo original do filme é “Mustang”.