O POÉTICO E O POLÍTICO SE UNEM EM “GUARNIERI”.

Por Celso Sabadin. 

É inegável nosso momento de retrocesso. Tanto político, quanto humano. O Brasil e o mundo se entortam para a direita e assuntos que pareciam mortos e enterrados saem de suas tumbas como zumbis devoradores de cérebros. Assim, o belíssimo documentário “Guarnieri”, sobre a vida, a obra e o pensamento do dramaturgo e ator brasileiro Gianfrancesco Guarnieri, vem revestido de uma tristemente impressionante aura de atualidade.

O longa, num primeiro momento, traz um forte mote humano e pessoal: seu diretor, Francisco Guarnieri, neto do biografado, busca através do cinema exorcizar, ou pelo menos tentar compreender, os motivos do distanciamento de seu famoso e querido avô. Uma mensagem gravada por Francisco, ainda criança, na secretária eletrônica de Gianfrancesco, e uma foto de ambos, que transpira visível afastamento, são de cortar o coração e proporcionam o combustível de saída para a investigação documental.

Contudo, como não poderia deixar de ser em se tratando de Gianfrancesco Guarnieri, logo emerge o viés político. Vigoroso, inevitável e absolutamente necessário. Através de textos do dramaturgo, e principalmente com a utilização de imagens do filme “Eles Não Usam Black-Tie”, o documentário traça um sólido eixo narrativo que vai amalgamar as relações pai/filho da ficção escrita por Guarnieri e dirigida por Leon Hirszman aos conflitos familiares vivenciados não apenas por Francisco, como também pelo seu pai, Fábio, e seu tio, Paulo. Lembrando que, cada um a seu modo, Fábio e Paulo também transitaram pelo mundo artístico e pelas armadilhas dos laços familiares.

O resultado é de forte carga dramática, inserindo-se tanto nesta nova e assustadora realidade política, como nas eternas questões insolúveis dos conflitos familiares.

 

 

 

Gianfrancesco Guarnieri foi um dos nomes mais importantes da história do teatro brasileiro. Além de ter sido um grande ator na televisão, ele foi uma imagem-síntese do artista engajado brasileiro. Porém, seus filhos atores, escolheram por distanciar arte, trabalho e política em suas vidas. Agora, seu neto e diretor Francisco busca compreender o lugar de sua geração na história, nas artes e no mundo.