“O PRAZER” DA VIDA E DO CINEMA DE OPHÜLS.

Por Celso Sabadin.

O cineasta alemão Max Ophüls – que transitou com maestria não só pelo cinema de seu país como também pelos estúdios franceses e norte-americanos –  talvez hoje fosse considerado “ostentatório”. Ou mesmo “maneirista”. Pode até ser. Mas o fato é que é uma delícia se deixar levar pelos verdadeiros balés cinematográficos que a câmera de Ophüls propõe ao espectador.

Neste “O Prazer”, por exemplo –  que o cineasta dirigiu na França em 1952 – a ação começa em ritmo de baile desde o primeiro instante. Assistimos encantados à movimentação frenética de um sofisticado e animado salão de danças que se contrapõe à ansiedade de um estranho homem mascarado que – em desespero – corre para o local. Com poucos cortes e muitos travellings, a câmera une com total habilidade e muito estilo a aflição deste homem que, sem perder seu ritmo, se une aos dançantes em festa como que amalgamando as alegrias, os medos e as ansiedades que se ocultam sob o regozijo do som e do bailado.

Trata-se apenas dos segundos iniciais de “A Máscara”, o primeiro dos três contos do escritor francês Guy de Maupassant que Ohpüls adapta neste longa.

No segundo, “A Casa Tellier”, sua câmera passeia, indiscreta, pelo lado de fora do imóvel citado no título, espiando pelas janelas, subindo e descendo escadas inexistentes, buscando o fortuito do olhar lascivo e proibido. Tudo porque a tal casa Tellier é um prostíbulo dos mais requisitados e festivos, que leva sua clientela ao desespero no dia em que, sem aviso prévio, decide fechar suas portas não se sabe porquê.

Novamente se vê, assim como em “A Máscara”, a contraposição lúdica dos alegres ambientes interiores femininos em contraste com o bailado ansioso dos desejos masculinos que ficaram trancafiados e represados do lado de fora do bordel.

E, finalizando, “O Modelo” fecha a trilogia, abordando as delicadas e complicadas relações amorosas e profissionais que se misturam nas vidas de um jovem pintor e sua bela modelo.

Os três contos não ganham tempos proporcionais no transcorrer do filme. Bem mais longo, “A Casa Tellier” ocupa a maior parte da projeção, ao transferir sua ação do prostíbulo urbano para um apaixonante passeio no campo, onde as moças de despem dos preconceitos inerentes à sua profissão e se entregam a uma bucólica paisagem provençal onde não faltam sequer momentos de intensa reflexão religiosa durante uma cerimônia de primeira comunhão.

Todo este caldeirão de sentimentos e sensações se potencializam na narrativa nunca menos que festiva de Opüls, que transforma seu cinema em puro deleite visual, fascinação e alegria de viver.

“O Prazer” foi indicado ao Oscar de direção de arte em preto e branco, numa época em que havia outra premiação para a mesma categoria, mas em cores.