“O SIGNO DAS TETAS”, ASSUMIDAMENTE HERMÉTICO.

Por Cid Nader.

Quando Frederico Machado insiste no seu discurso de apresentação sobre seu filme ser extremamente hermético – além de falar da evidente dificuldade que deve ser mesmo fazer cinema no Maranhão, mas também, alertando para uma incipiente produção em processo –, e insiste de novo, e de novo, emendando que mesmo assim entedia que seria criado “um diálogo” com o público. Nesses casos quase me coloco na desobrigação de aprofundar um texto crítico no caso de incompreensão total do que o filme irá me dizer, ainda mais em momentos (uma Mostra como a de Tiradentes) que exige demais no pouco tempo que temos para elaborar e escrever. Fala e homenageia o poeta maranhense Nauro Machado, ainda vivo, como uma referência ao filme e como autor de maior importância em sua formação. Um tanto do que ocorre em tela pelo processo de exibição de O Signo das Tetas, de forma evidente está contido em fugazes avaliações do poeta e de sua obra: e então fica mais fácil compreender que o personagem central nas recordações elaboradas e pensadas da mãe (alvo de suas buscas em pensamento por todo o trabalho) sofre demais por “ser um ser” angustiado em sua existência, e que carrega nessa busca alguma razão que valide o fato de sua existência.

Pàrticularmente não gosto muito do resultado no todo: percebo-o menos “ligado” do que no longa de estreia do diretor, O Exercício Caos. E não por conta da falta de algum tipo mais perceptível de linearidade, de continuidade, de compreensão por história contada com mais detalhes e caminhos visíveis, mas porque essas ligas que me parecem ausentes impedem – no corte do fluxo, na inserção de enormidade de signos absolutamente pessoais (ou à obra, ou ao personagem, ou ao próprio diretor, mais ainda, e provavelmente à sua ligação com a obra de Nauro) -, de forma proposital a aproximação curiosa de quem vê e quer ser parte de alguma maneira. Filmes que isolam “propositalmente” o espectador (como qualquer arte que se fecha de maneira a não ser, talvez, questionada) não são a proposta que mais me incitem e atraiam…

De todo modo, impossível negar algumas qualidades que saltam à vista e que são “elementos” com os quais costumo lidar com prazer em minhas críticas. No aspecto estético, Signo das Tetas funciona bem e até é melhor do que o anterior. Quem me conhece e ao meu jeito de tentar entender cinema perguntará se a estética adequada não seria o suficiente para meu agrado – pois sabem que vociferam em favor das imagens acima de tudo, e no trato delas? Bastante sim, e por isso não dispenso totalmente o filme.

E aqui cesso a fase do desgostar, para capturar na pista do segundo episódio (o filme é dividido em três) razões relevantes e totais de liga, emprestando quase todas razões do filme ser, de existir, colocando em cheque parte de meus questionamentos de incompreensão. Temos um filme, enfim, após pesquisa no sentido de palavras… Mas, e o “diálogo com o público”? É justo que a obra só se faça compreendida após ela sozinha sendo-nos entregue, pelo apêndice da explicação extra ou da pesquisa? Uma questão está jogada…

PARTE 1 – SIGNOS:
A câmera explode a tela de “sujeiras”, de tempos que são os de passagem do personagem pela vida, enquanto a volta ou busca de uma “vida”, da existência, inicia seu percurso. E se há os devidos exageros cênicos – e há-, há também um escarafunchar por entre as coisas que permitem a sensação plena da presença e da vitalidade daqueles locais, enquanto, também, o estranho momento do quarto (que é o de uma imersão) também tem sua valorização na estranheza do montado e editado. São o instante de muita informação, que preenchem um setor de estética apropriada para quem não está em paz.

PARTE 2 – HIDROPSIA
A chave do filme está aí, e a visão da casa, de cima, na chegada do “forasteiro”, é espantosa: raro quadro de luz e cores, com composição do entorno se fazendo a possibilidade única de diferenciá-lo do estático. A água, de tremenda importância, e retratada de forma absurdamente abundante e acolhedora – invasora, também – ganha contornos raras vezes vistos por aqui; as crianças na beira são de impacto e lirismo esclarecedor, a estada ali, naquele espaço de acolhimento (e dor) cria os minutos mais difusores do trabalho, no qual o espectador pode ao menos delirar sem necessidade da busca maluca de informações – esteticamente pode representar o período em que Signo das Tetas é menos signo e mais simbolicamente capturador.

PARTE 3 – TETAS
Dos tempos angustiantes, onde há o deslocamento e o ir e vir da representação inicial para a segunda, pois se prepara nele o final. Mas o que mais é palpável, também, onde a carne e o toque pedem sua vez, onde as tetas, afinal, emprestam realidade ao ser (não ser) que é o que nos conduz por seu “drama”. Nesse período, a vida é mais clamante, as águas ganham outra conotação em prejuízo ao delírio até visual do segundo episódio, a não vida está mais insinuada: é quando voltam os signos, quando se delineia um final que será assim, abrupto.

Ficam questões mais atreladas ao que um filme pode sugerir e não entregar, quando na realidade quer ser compreendido.

 

Texto publicado originalmente no site www.cinequanon.ar.br por ocasião da cobertura do Festival de Cinema de Tiradentes.