O SILÊNCIO SOFRIDO DE “A ESPERA DE LIZ”. 

Por Celso Sabadin.

Talvez Freud explique: em várias oportunidades eu li errado o nome do filme “A Espera de Liz”, trocando-o, na minha cabeça, por “À Espera da Luz”. Ao final do filme, percebo que meu erro tem – inconscientemente, claro – uma razão de ser: a trama mostra protagonistas em profundo processo de elaboração de dores e perdas, o que não deixa de ser uma busca pela luz interna de cada um. E é exatamente sobre isso que o longa fala: buscas, procuras.

O filme é divido em duas partes: a primeira, rodada na Serra Gaúcha, é marcada por uma bela fotografia e por uma direção de arte que sublinha os tons frios, tudo para emoldurar e potencializar a depressão de Liz (Simone Iliescu, também corroteirista do longa). Por um motivo ainda não revelado ao espectador, ela cada dia mais se fecha, triste e desesperadoramente, dentro de si própria. Sua irmã, Lara (Rosanne Mullholland), talvez consiga as chaves para abrir o coração de Liz.

Na segunda parte, o azul escuro, a água, o cinza e o preto dão lugar ao laranja, ao sol, à poeira e à rispidez árida do interior da Venezuela. É nas estradas daquele país que Miguel (Bruno Torres, também diretor e corroteirista do filme) tenta, sem sucesso, fugir de suas dores de alma. Ele procura mudar sua geografia na busca vã de alterar sua história.

“A Espera de Liz” é lento (e isso é um elogio), poético e reflexivo. Suas ações são muito mais internas que externas, enquanto suas aflições são expressas em silêncios expressivos e enigmáticos enquadramentos gráficos. Estranha-se apenas que, numa obra de apelo visual tão vigoroso, suas tensões finais (e isso não é spoiler) sejam resolvidas via soluções verbais, e não através da poderosa linguagem cinematográfica que o longa demonstra durante praticamente toda a sua duração.

Vale também um aviso: para melhor embarcar nas trajetórias de  Liz, Miguel e Lara, convém não ler as sinopses nem ver o trailer do filme, que entregam muito mais do que deveriam.

“A Espera de Liz” marca uma promissora estreia na direção de longas de Bruno Torres, autor dos premiados curtas “O Último Raio de Sol” e “A Noite por Testemunha”.  Já em cartaz nos cinemas.