“O SOBREVIVENTE”: UM ALEMÃO APAIXONADO PELOS EUA

Werner Herzog, quem diria, se rendeu a Hollywood.
O ex ‘enfant terrible‘ alemão, que tanto sucesso fez nos anos 70 e 80 com obras inquietantes como “O Enigma de Kaspar Hauser”, “Coração de Vidro”, “Stroszek” e várias outras, está lançando seu primeiro filme de ficção totalmente produzido nos EUA.
Após o ótimo “O Homem Urso” (também de produção norte-americana, porém, documentário), Herzog foi buscar inspiração na história real de seu conterrâneo Dieter Dengler para roteirizar e dirigir “O Sobrevivente”. Na verdade, Herzog já conhecia muito bem a vida de Dieter, que pesquisou a fundo para realizar o documentário “O Pequeno Dieter Precisa Voar”, de 1997. Agora, com um orçamento estimado em US$ 10 milhões, e o apoio da Metro-Goldwyn-Mayer, a saga de Dieter Dengler virou uma boa ficção.
Mas quem foi, afinal, Dieter Dengler? Um imigrante alemão que se alista nas forças armadas dos EUA com o sonho de se tornar piloto de aviões. Um sonho que começa a se transformar em pesadelo em 1965, quando o então jovem piloto – agora tenente – recebe finalmente sua primeira missão militar durante a Guerra do Vietnã, e é abatido sobre o Laos. Capturado pelo inimigo, ele e mais cinco prisioneiros vivem um verdadeiro inferno em meio à instransponível mata fechada do sudeste asiático, enfrentando fome, torturas psicológicas e os mais cruéis tipos de privações. É sobre este período da vida de Dieter que se concentra o filme de Herzog.
Cineasta apaixonado pelas situações extremas (quem não se lembra de ‘Aguirre a Cólera dos Deuses‘ ou ‘Fitzcarraldo’ ?), Herzog dedica praticamente o filme inteiro a expiar a dor e a indignação deste grupo de homens que chegam às raias da animalidade na busca insana pela sobrevivência. Até que ponto conseguimos ir na luta pela vida? Os personagens de “O Sobrevivente” vão fundo. Já o filme, nem tanto. Embora dirigido com competência, o roteiro faz claramente uma opção comercial de não chocar o público a níveis que poderiam comprometer seu faturamento. A vida dos cinco prisioneiros – supõe-se – resvalaram numa radicalidade que o filme prefere evitar.
Tudo é de certo ponto amenizado para o gosto padrão do grande público, e não se percebe na narrativa do Herzog (atualmente com 65 anos) inquieto de outras épocas. Mesmo assim o diretor manteve algumas de suas idiossincrasias, como fazer questão de filmar realmente nas condições adversas da selva (desta vez a locação foi na Tailândia) e submeter seu elenco a um rigoroso trabalho físico, de modo que todos efetivamente emagrecessem de forma visível durante as filmagens, conferindo maior veracidade ao projeto.
O papel principal ficou com o eficiente Chrtistian Bale (o ‘novo’ Batman), que numa determinada cena do filme parece reviver um momento vivenciado pelo personagem que ele próprio interpretou em “O Império do Sol”. Repare que a visão que ele teve quando garoto, ao travar contato visual com um piloto dentro de seu avião, é extremamente similar a uma famosa cena do filme de Spielberg.
‘Viagens’ do cinema. De qualquer maneira, pode-se dizer que “O Sobrevente” é um bom filme.
Mas não é um bom filme de Werner Herzog, de quem se espera sempre mais.