“Os 3″ FAZ ELABORADO RETRATO DE UMA GERAÇÃO.

“Os 3”
Curioso e muito bem elaborado retrato de uma geração.
Como dizia Gilberto Braga, ‘toda boa história começa com uma festa’. E repare, todas as antigas novelas das 8 (as memoráveis), sempre tinham uma grande festa no primeiro ou segundo capítulo. São apresentados os personagens principais, esboçam-se as intrigas, e a atenção está conquistada.

No caso do filme “Os 3”, acontece coisa similar. Nos créditos de abertura (muito elegantes), uma narração em off – praga que infesta 9 entre 10 dos filmes nacionais atuais – desenha os principais focos da narrativa: uma delicada e moderna (adjetivo discutível) história de amor.

Camila (Juliana Schalch), Casé (Gabriel Godoy) e Rafael (Victor Mendes) esperam, ansiosos, na fila do único banheiro disponível numa balada. Com a demora, cria-se o impasse: eles vão deixar a moça usar o banheiro antes deles? Não. Surge então a proposta (de Camila) – quase um desafio: ‘Vamos os três juntos?’ Meio constrangidos, os rapazes topam. Lá dentro, conversando, descobrem estar os três na mesma situação: vindos do interior, ingressaram na mesma faculdade, no mesmo curso (que não era a primeira opção de nenhum deles) e dois deles estão sem local para morar. Ao final da festa, Cazé oferece o lugar onde está, para que dividam o espaço e as despesas.

E lá vão eles, alojando-se num armazém semi-abandonado, iniciar um convívio que vai mudar a vida de todos, para sempre. A empatia é tão automática que, além de viverem e estudarem juntos, passam praticamente todo o tempo neste seu microcosmos. São conhecidos, na faculdade, como “Os 3”.

Uma única condição (que se revelará impraticável) é imposta por Camila: eles não podem se relacionar (romanticamente) entre si, de modo que ninguém se sinta excluído. E, neste inocente jogo de amizade x sedução, a relação deles caminha, enquanto o curso corre (um longo período de 4 anos).

Como trabalho de finalização de curso, eles elaboram um programa interativo tipo Big Brother, onde uma família é observada full time, promovendo a venda de bens e produtos que utilizam. Ou seja, quem acompanha on-line o programa pode adquirir tudo o que vê em cena, de lençóis a eletrodomésticos. O projeto é tão interessante que atrai a atenção de um produtor (Rafael Maia), que propõe que eles mesmos sejam os protagonistas do programa a ser, realmente, produzido.

Vendo nisso uma oportunidade de trabalho (afinal, recém formados, fatalmente se dispersariam pelo competitivo mercado de trabalho) e, principalmente, uma chance de permanecerem juntos por mais tempo, os três aceitam a proposta.

Curioso e muito bem elaborado retrato de uma geração meio perdida e sem rumo, emergente no país, “Os 3” apresenta um grande diferencial na cinematografia nacional corrente: investe em gente ‘normal’. Um roteiro muito bem amarrado, com diálogos de uma coloquialidade há muito não vista em nossas telas, traz um núcleo central de atores extremamente empático ao expectador: todo mundo conhece (ou conheceu) pessoas como Camila, Cazé e Rafael. Eles eram os colegas de faculdade: a garota decidida e sedutora; o cara que não faz a menor idéia do quer da vida (mas isso também não tem muita importância); e o postulante a escritor, sensível, porém seguro de suas posições e emoções. Com a vantagem de que o elenco – muito bem selecionado – é um espelho da juventude classe média atual; ninguém é ‘bonito demais’, ‘sarado demais’, ‘fotogênico demais’. E é justamente isso que tanto os aproxima do público. É fácil enxergar neles seu colega, filho ou sobrinho. Eles existem, sem licença poética. Ninguém é ‘rico demais’ ou ‘pobre demais’, e o maniqueísmo (ou a falta dele) se estende às suas atividades e posturas. São todos críveis.
Destaque também para os dois veteranos, Alceu Nunes (Heraldo) e Henrique Taubaté (Josias), os donos da empresa que produz o programa, numa aula de naturalismo em cena.

Em resumo, um filme urbano (como poucos o são), onde a estética da fome, da violência ou ainda do humor barato (outra praga no cinema nacional recente), parece ter passado ao largo. E não faz nenhuma falta. Não deixe de ver!

“Os 3” (Brasil – 2011 – 80’) Direção: Nando Olival Com: Gabriel Godoy, Victor Mendes, Juliana Schalch, Rafael Maia, Alceu Nunes e Henrique Taubaté, entre outros.