“OS AMIGOS” É A AFETIVA POESIA CONCRETA DA CIDADE.

 por Celso Sabadin.

Existe amor em São Paulo. A frase, às vezes com ponto final, às vezes com ponto de interrogação, já faz parte do inconsciente coletivo paulistano. Ela não é citada explicitamente no filme “Os Amigos”, mas permeia toda a trama.

Roteirizado e dirigido por Lina Chamie (de “Tônica Dominante” e “Via Láctea”), o filme mostra um dia muito especial da vida de Theo, papel de  Marco Ricca, talvez em sua melhor interpretação no cinema até aqui. Logo de manhã, um velório que lhe provocará muitas lembranças de infância. À tarde, o desafio é conciliar o trabalho com a singela tarefa de comprar um presente, e continuar driblando as memórias. Tudo sob a ameaça de uma grande tempestade que provavelmente virá. Mas a noite talvez seja de bonança, quem sabe.

Filha do conceituado poeta concretista Mário Chamie, Lina coloca em seu filme deliciosas referências/lembranças deste estilo de fazer poesia. Só em São Paulo, talvez, alguém fica “preso no vão livre”. Assim como livre também é toda a estrutura narrativa, que dá um chega pra lá no excesso de naturalismo, privilegiando as liberdades e licenças poéticas. Que bom! Que bom uma loja de brinquedos onde o consultor de vendas é um garotinho nerd. Que bom passear no zoológico! Que bom ter amigos! Que bom ver um filme afetivo, afetuoso e emotivo, sem a necessidade formal de amarrar todas as pontas, e onde até as memórias de um amigo morto podem se transformar num carinhoso jogo de bafo.

Mesmo lembrando que viver é uma odisséia onde a tempestade urbana pode desabar sobre as cabeças dos heróis e super-herois do cotidiano.

Livre, “Os Amigos” é um filme de carinhos que, ao seu final, deixa uma saudável sensação de quero mais.

No elenco, Dira Paes, Caio Blat, Alice Braga, Rodrigo Lombardi, Fernando Alves Pinto, Sandra Corveloni e algumas meteóricas participações especiais tão afetivas quanto o próprio filme.