“OS DONOS DA NOITE”, COM ESTILO E JEITÃO DE COPPOLA

Não confunda os nomes: este “Os Donos da Noite”, que estréia neste feriadão, nada tem a ver com “Os Donos da Noite” de 1989, com Eddie Murphy, embora sua trama seja ambientada nos anos 80. Confuso? Não é para menos. Depois da extinção do Concine, em 1990, os títulos dos filmes em português deixaram de ter algum tipo de controle, e as traduções viraram um verdadeiro balaio de gatos. Hoje, o mercado brasileiro de cinema e DVD está, literalmente, “Lost in Translation”. Ou, “Encontros e Desencontros”, como traduziria algum gênio de marketing mais desavisado.

De qualquer maneira, este “Os Donos da Noite” é um belo e envolvente drama policial ambientado na violenta Nova York de 1988. É neste delicado momento da cidade que. Bobby (Joaquin Phoenix, de “Gladiador”), gerente de um badalado clube noturno, se vê numa posição das mais desconfortáveis. Por um lado, ele é um empresário da noite, e sabe que é bom para os seus negócios tolerar a presença de traficantes em sua boate. Por outro, ele é irmão do tenente de polícia Joseph Grusinsky (Mark Wahlberg), e também filho de ninguém menos que o próprio chefe de polícia Burt Grusinsky (Robert Duvall). Para piorar ainda mais a situação, Bobby usa um sobrenome artístico, escondendo de todo o submundo da noite que ele próprio também é descendente de russos. Quando a polícia passa cada vez mais a apertar o cerco contra a criminalidade, Bobby se vê obrigado a perceber – da forma mais dolorida – que será preciso tomar definitivamente uma posição. Nos negócios, na família, no amor e na vida.

Concorrente à Palma de Ouro no Festival de Cannes deste ano, “Os Donos da Noite” tem um sabor muito bem-vindo de “O Poderoso Chefão”. Assim como a obra prima de Coppola, o filme também sabe como armar meticulosamente uma empolgante trama familiar que caminha caprichosa e perigosamente no fio da navalha do crime. Em vários aspectos, o personagem Bobby guarda pontos em comum com o de Michael Corleone (Al Pacino), principalmente no primeiro capítulo da trilogia. Ambos também são violentamente chamados a participar. Querendo ou não. E – coincidência ou não – os dois filmes têm até um ator em comum: Robert Duvall.

Talvez o clima de veracidade exalado por “Os Donos da Noite” se deva ao fato de seu diretor e roteirista – James Gray – ser ele próprio neto de imigrantes russos. E de ter sido criado no bairro novaiorquino de Queens. Este é apenas o terceiro longa do cineasta, que com sua (até agora) curta carreira já obteve várias premiações e indicações importantes, como a participação na Mostra Competitiva de Cannes com “Caminho sem Volta” (também com Phoenix e Wahlberg), e os dois prêmios obtidos no Festival de Veneza com
“Fuga para Odessa”. Seu próximo projeto – “Two Lovers” – previsto para 2009, também será estrelado por Joaquin Phoenix.

“Os Donos da Noite” não é uma história simplista de mocinhos e bandidos, mas sim de pessoas multifacetadas, repletas de humanidade, e que por circunstâncias da vida acabaram por se posicionar em lados opostos do muro. Um muro que agora está prestes a ruir.
De fotografia densa e escura – coerente com o tema – e abordagem intimista, o filme guarda pelo menos um grande momento de tensão e beleza cinematográficas: numa angustiante perseguição de carros debaixo de uma pesada chuva, a direção opta por eliminar qualquer muleta musical, e amplifica aflitivamente o ruído insistente dos limpadores de pára-brisa. Genial.
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Os Donos da Noite (We Own the Night). EUA, 2007. Direção de James Gray. Com Joaquin Phoenix, Mark Wahlberg, Robert Duvall, Eva Mendes.