OS IRMÃOS COEN ACERTAM NOVAMENTE COM “ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ”

Longos planos abertos. Muita poeira e muito silêncio na vastidão árida do Texas. Uma mala cheia de dinheiro, um homem comum, um punhado de criminosos, e altas doses de sarcasmo e cinismo. Estão alinhavados os elementos básicos ideais para o novo filme escrito e dirigido pelos sempre criativos irmãos Ethan e Joel Coen: “Onde os Fracos Não Têm Vez”.

A ação se passa nos anos 80, momento em que o caladão Llewelyn (Josh Brolin), ao caçar veados em pleno deserto, se depara inadvertidamente com um cenário de guerra: cinco camionetes abandonadas, dispostas quase em círculo, praticamente a mesma formação que as antigas carroças dos pioneiros usavam para se defender dos ataques indígenas. Dentro delas, cadáveres ensangüentados, incontáveis buracos de bala, e um carregamento de drogas. Há apenas um sobrevivente, agonizante. Astuto, Llewelyn liga os pontos e logo chega ao fator decisivo que desencadeou todo aquele massacre: uma mala entupida de dólares. Achado não é roubado. Porém, o pacato cidadão terá sérios problemas para manter o dinheiro em seu poder, já que a mala também está sendo procurada por Chiguhr (Javier Bardem), um psicopata completamente enlouquecido que mata suas vítimas com uma potente arma de ar comprimido. No meio deste jogo mortal de gato e rato está a figura enigmática do xerife Bell (Tommy Lee Jones), um homem calejado que parece já ter visto de tudo na vida.

A simples leitura desta sinopse remete a vários outros filmes já realizados pelo cinema com maior ou menor grau de competência. O clichê do homem comum que encontra uma grande quantidade de dinheiro e é caçado por isso pode ser visto tanto em “Um Plano Simples”, de Sam Raimi, como em “O Homem que Copiava”, de Jorge Furtado, entre tantos outros.

O diferencial de “Onde os Fracos Não Têm Vez” não está no conteúdo, mas na forma pela qual a história é (re)contada. Mais uma vez, os Coen recriam um universo de tipos impagáveis, de personagens fascinantes que trafegam livremente pela finíssima linha que divide a lei da marginalidade, vida da morte, o sucesso absoluto do ostracismo total. E sempre com a marca registrada dos irmãos: o cinismo.

Com estética de faroeste, o filme flutua com desenvoltura tanto pelo drama sanguinário como pela comédia sarcástica. Seu ritmo é contemplativo, sem pressa, e – raridade hoje em dia – quase nunca se recorre à trilha sonora. E os diálogos são fascinantes.

Estranha-se inclusive que um trabalho com tão poucas concessões comerciais tenha sido indicado para tantos prêmios Oscar (oito), que sabidamente prefere a indústria em detrimento da arte cinematográfica. O mesmo estranhamento causado pelo também ótimo “Sangue Negro”. Melhor para a Academia, que assim dá um passo no sentido de se redimir de tantos equívocos históricos que tem cometido nas últimas décadas.

De qualquer maneira, “Onde os Fracos Não Têm Vez” é um filme para quem gosta muito mais de cinema do que do Oscar.