OS UNIVERSOS OPOSTOS DE “MADEIRA E ÁGUA” NÃO SÃO APENAS OS GEOGRAFICOS.

Por Celso Sabadin.

Seria bonito dizer que “Madeira e Água” é um filme sobre o conflito entre dois mundos opostos. Afinal, trata-se da história de uma mãe que viaja até o outro lado do planeta para rever seu filho. Mas, na verdade, embora seja realmente sobre mundos opostos, o filme opta por um outro tipo de “conflito”: o visual.

Isto porque o choque de realidade entre o habitat natural desta mãe que acaba de se aposentar (a belíssima região da Floresta Negra, na Alemanha) e o seu destino de viajante (o caos urbano de Hong Kong) desenvolve-se no plano narrativo/estético/visual e não parece afetar a protagonista. E é isto que torna o filme ainda mais interessante: o abismo que se estabelece não exatamente entre os mundos ocidental e oriental, mas entre o interior da protagonista e o exterior que a contém.

Anke (vivida por Anke Bak, mãe na vida real do diretor do longa, Jonas Bak) é uma personagem que exala a paz dos bosques onde nasceu e vive. Ao transportar-se para Hong Kong, ela carrega em sua bagagem esta tranquilidade, não se deixando desequilibrar pelo mar de gente e de edifícios que permeiam a cidade, muito menos pelas dificuldades que porventura encontre em seu caminho. Chega até a parecer indiferença, mas prefiro acreditar que seja maturidade.

Ainda que poucas e breves, as relações humanas que Anke trava em sua rápida passagem pelo oriente trazem uma leveza invejável. Sai para almoçar com o porteiro do prédio do seu filho, fala no ônibus com gente que nunca vira antes e – num dos mais belos momentos do filme – conversa amigavelmente com uma mulher de quem sequer vê o rosto, ao mesmo tempo em que divide o quarto com ela. Para nós, neuróticos urbanos assustados com as violências e traições das sociedades subdesenvolvidas, tudo parece quase um sonho.

Sintonizado com o ritmo lento, poético e contemplativo de sua protagonista, “Madeira e Água” foi exibido na seção Perspectivas do Cinema Alemão do Festival de Berlim, e é o primeiro longa de Jonas Bak.

Coproduzido por Alemanha, França e Hong Kong, o filme está na programação da 45ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em cartaz de 21 de outubro a 3 de novembro. Saiba mais em https://45.mostra.org