OU GODARD FEZ SEU FILME MAIS RADICAL, OU PIROU DE VEZ.

Por Celso Sabadin.

Se, como dizia Nelson Rodrigues, “toda unanimidade é burra”, o cineasta suíço Jean-Luc Godard deve ser uma das pessoas mais inteligentes do mundo, pois se existe algo que ele não é, nunca foi, e nunca será, é “unânime”. Alvo simultâneo dos mais apaixonados elogios e das críticas mais cruéis – Godard tem sua vida e sua carreira marcadas pelos mais diversos tipos de polêmicas, tanto pessoais, como profissionais. E nem poderia ser diferente para um profissional que sempre se dedicou à ruptura, ao experimentalismo audiovisual, à quebra das estruturas pré-estabelecidas, à criação artística exacerbada. Se há em sua vasta obra um limite que especifique onde acaba a inquietação artística e começa o exibicionismo vazio, não será este pequeno e modesto texto que irá estabelecer. Afinal, o próprio cineasta já sugeriu que seu nome é diretamente relacionado às palavras “God” e “Art”.

O fato é que, neste seu longa mais recente, ou Godard realizou seu trabalho mais radical, ou pirou de vez. “Imagem e Palavra” é uma colagem visual e sonora dos pensamentos esparsos do cineasta, teoricamente organizados sob uma lógica que talvez seja decodificada apenas pelo próprio autor. Ou talvez nem deva ser codificada. Mesmo porque o próprio cineasta proibiu que algumas falas do filme fossem traduzidas e legendadas Abordando alguns temas clássicos hoje repaginados como a dicotomia esquerda/direita, ao mesmo tempo em que se apoia tangencialmente na contemporaneidade da questão dos refugiados, o filme desafia os mais variados níveis de percepção por parte do público, não se furtando a subverter qualquer código de recepção cognitiva. Várias camadas sonoras simultâneas se juntam à sua já conhecida obsessão pela fragmentação de ícones e imagens para compor um mosaico áudio/visual/formal/emotivo feito muito mais para ser sensorializado que compreendido.

Afinal, é Godard. Ame-o ou deixe-o, como se dizia na ditadura. E talvez vote a se dizer.