“PELO MALO” REFLETE DRAMA HUMANISTA PELOS OLHOS DE UMA CRIANÇA.

Tão perto e tão longe, o cinema feito na Venezuela quase nunca tem espaço por aqui no Brasil. Para quebrar pelo menos um pouquinho desta escrita, estreia em (alguns poucos) cinemas brasileiros o belo drama venezuelano “Pelo Malo”.
Premiado em vários festivais internacionais (Havana, Mar Del Plata e San Sebastian, entre outros), ”Pelo Malo”, que pode ser livremente traduzido como “Cabelo Ruim”, conta a história de Júnior (o estreante Samuel Lange Zambrano, perfeito no papel), um garoto cujo sonho é alisar seu cabelo e sair bonito na fotografia (literalmente) da escola, posando de cantor. Faltam poucos dias para a foto e Marta, a mãe de Júnior (Samantha Castillo, também estreante e também ótima) além de não ter o dinheiro para o fotógrafo, ainda reprova totalmente as obsessões estético-capilares do garoto.
Enquanto isso, o circo de horrores da mídia local não se cansa de explorar as bizarrices em torno de uma parte da população que aguarda ansiosa por um milagre que cure o câncer do então presidente Hugo Chávez.

O conflito mãe/filho embasa o preconceito de Marta, para quem cantar e cuidar dos cabelos são sinalizadores de homossexualidade. A felicidade, aqui, gera uma culpa tão insuportável para a protagonista opta por um desfecho que, se não chega à tragédia, escancara um dos diálogos finais mais cruéis já mostrados na tela.

Como moldura de toda esta disfunção familiar, a roteirista e diretora Mariana Rondón (vencedora do Cine Ceará 2008 por “Postales de Leningrado”) situa a ação na violenta periferia de Caracas, onde nem o som dos tiros que cruzam os gigantescos condomínios decadentes são suficientes para tirar seus habitantes do torpor.

Coproduzido por Venezuela, Peru, Argentina e Alemanha, “Pelo Malo” ainda traça um cruel e até tragicômico painel crítico sobre a histórica e famosa tradição Venezuela em relação aos concursos de misses.
Um belo trabalho de um país geograficamente vizinho, mas cinematograficamente de outro mundo.