PETER JACKSON NOVAMENTE SUPERLATIVO EM “MÁQUINAS MORTAIS”.

Por Celso Sabadin.

Em determinado momento de “Máquinas Mortais”, uma das heroínas diz que é necessário esperar que ela dê um sinal para que o ataque seja iniciado. Uma outra heroína (há várias) lhe pergunta que sinal seria este. A líder responde que, quando for o momento, ela saberá. E arremata: “Eu não sou nada sutil”. A frase rotula e simboliza o próprio filme: “Máquinas Mortais” pode ser tudo, menos sutil. O que não é exatamente um problema, mas sim o reflexo do estilo de um produtor consagrado pelo gigantismo: Peter Jackson, da saga “O Senhor dos Anéis”.

Num aterrorizante futuro pós-apocalíptico, as metrópoles agora não ficam mais fixas no solo e, instaladas sobre máquinas gigantescas (põe gigantescas nisso), elas saem pelo planeta destruindo e engolindo cidades menores. É neste cenário de terra arrasada que Taddeus Valentine (Hugo Weaving) comanda uma Londres “móvel” que violenta e ambiciosamente sai pela Europa engolindo civilizações menos poderosas. Como se nota, o próprio conceito básico do filme exige o gigantismo citado acima.

Assim, tudo é superlativo em “Máquinas Mortais”. A direção de arte é das mais fantásticas, amalgamando sem cerimônias elementos das mais diversas épocas passadas e futuras, enquanto os efeitos visuais e sonoros seguem o “padrão Peter Jacskon de qualidade”, de tirar o fôlego, e operando alguns tons acima de qualquer média que se estabeleça.

Porém, se todo o aspecto visual de “Máquinas Mortais” hipnotiza e chama a atenção, o mesmo não se pode dizer do roteiro (baseado no livro do escritor e ilustrador inglês Phillip Reeve, e que também conta com Jackson como um de seus adaptadores), que não resiste a análises um pouco mais elaboradas e acaba patinando na boa e velha luta do Bem contra o Mal, aqui novamente embalada pelas incessantes correrias e brigas tão caras aos filmes que pretendem estourar a boca da bilheteria.

Mesmo assim, há algumas leituras interessantes a serem feitas. Principalmente a analogia das cidades móveis e impiedosamente destrutivas que “engolem” as menores, uma clara referência à ferocidade do capitalismo atual e a uma de suas consequências mais terríveis: o drama dos refugiados. Há até uma cena na qual uma voz ao alto-falante, dirigindo-se a um dos povos “engolidos”, informa que as crianças podem ser “momentaneamente” separadas dos seus pais. Como o governo Trump fez recentemente com refugiados mexicanos. Não por acaso, todo o filme é centrado nesta Londres do futuro, que retoma aqui seu histórico DNA de cruel colonizadora. Afinal, a Nova Zelândia de Peter Jackson foi colonizada pelos britânicos, vale lembrar.

Também é sagaz a crítica feita através das reações da população de Londres, que aplaude as ações bélicas dos comandantes da cidade em clima de festa e de grande evento esportivo, torcendo e vibrando com a morte de milhares de oponentes, e demonstrando assim uma assustadora alienação típica de quem acredita que a vida é um reality show. Lembrou o antigo “Rollerball”.

Coerentemente, a direção de “Máquinas Mortais” foi entregue a um especialista em efeitos visuais, Christian Rivers, que já havia trabalhado com Jackson em seus filmes anteriores, sempre nos departamentos de arte e de efeitos. Esta é sua primeira direção de longas, onde ele demonstra uma certa mão pesada para as relações humanas, ao mesmo tempo em que manda bem no ritmo e nos aspectos visuais.

Como sempre, o único momento em que funciona com eficiência este 171 chamado 3D é vinheta da contagem regressiva do IMAX. O resto é caça-níquel. Prefira o 2D.