“POLÍCIA, ADJETIVO” É O CINEMA SEM PRESSA.

Escolha um bom lugar, sente-se na poltrona do cinema, relaxe e deixe o mundo lá fora. Certifique-se que nas próximas duas horas nenhum problema o afligirá. Faça xixi antes. E com este total desprendimento prepare-se para degustar (esta é a palavra) um filme que não tem absolutamente nada a ver com o ritmo frenético das grandes cidades, ao qual estamos – infelizmente – acostumados. Digo “grandes cidades” porque se você estiver numa cidade pequena e pacata, ou ela não tem cinema, ou ela não exibirá esta produção romena “Polícia, Adjetivo”.

Com um ritmo totalmente próprio, o diretor Corneliu Porumboiu (o mesmo de “A Leste de Bucareste”) não tem pressa nenhuma em contar a história de Cristi, um policial que investiga um caso de drogas numa escola de alguma cidadezinha perdida no interior da Romênia. Consciente dos processos de transformação pelos quais passa seu país, Cristi vive um dilema muito particular: escrever ou não um relatório que incrimina um garoto consumidor de drogas. Se o seu parecer for contrário ao jovem, o rapaz poderá pegar 7 anos de prisão apenas por causa de alguns baseados. Se não for, Cristi estará infringindo a lei de seu país, colocando em risco seu emprego. Enquanto tenta resolver o caso (no amplo sentido da palavra), o investigador… investiga. Segue o seu suspeito a passos lentos, passa horas em frente à casa da família, pára, pensa, fuma em tempo real. A vida segue devagar no interior da Romênia (e na tela), para o desespero de toda uma geração de espectadores que nasceu na era do videoclipe, e para o deleite de quem prefere o cinema contemplativo.

O computador sobre a mesa de Cristi jamais é ligado. Seus relatórios são escritos a mão, como se ainda vivêssemos na era da extinta União Soviética. E o diretor Porumboiu permite que seu público “espie” estes mesmos relatórios da maneira mais rudimentar – cinematograficamente falando – possível: colocando-os diante da câmera, para que sejam lidos. Por que o policial os assina com as inicias A e S permanece um mistério.

A vida pessoal de Cristi é tão lenta e contemplativa quando à profissional. Só lá pela metade do filme, entre uma colherada de sopa e outra do protagonista, que percebemos que ele tem uma esposa. Não fosse por seu dilema moral, não seria difícil arriscar um palpite que Cristi está nesta vida apenas para ver o tempo passar. Eventualmente, ele joga com os colegas o que chama de “foot-tênis” (uma espécie de futevôlei) e conversa sobre música com a profundidade de um pires. É a total desglamurização da vida de um policial. Ou, em outras palavras, da vida que o cinema americano nos vendeu como se fosse a de um policial. É a contramão das aventuras policialescas do cinemão comercial

Os minutos finais do filmes são reservados para um primor de ironia que espelha o pensamento burocrático típico do funcionalismo público e – claro – da alma policial: o chefe de Cristi o submete a uma imersão em definições de dicionário, na tentativa de dissuadi-lo do tal dilema moral que tanto o atormenta.

O protagonista percebe que não tem direito a ser uma pessoa, um substantivo, um sujeito, muito de ser verbo. E vai ser obrigado a perceber que Polícia é nada menos que um adjetivo.

Prêmio do Júri e FIPRESCI na mostra Un Certain Regard do Festival de Cannes em 2009, “Policia, Adjetivo” será o candidato da Romênia ao Oscar de filme estrangeiro.

POLÍCIA, ADJETIVO
(Politist, Adjectiv)
Romênia, 2009, 115 minutos
Direção: Corneliu Porumboiu.
Com Dragos Bucur, Vlad Ivanov, Ion Stoica, Irina Saulescu.
Distribuição Imovision
Estreia 5 de dezembro.