“PONTO ZERO”, UM MERGULHO RADICAL NA ADOLESCÊNCIA.

Por Celso Sabadin.

Assisti “Ponto Zero” no Festival de Gramado do ano passado. E lembro que uma curiosidade me chamou a atenção: nada menos que quatro longas brasileiros da mostra competitiva daquele evento destacaram em

seus temas básicos o relacionamento pai/filho. E o mais radical deles foi o gaúcho “Ponto Zero”, escrito e dirigido por José Pedro Goulart.

O filme é um inquietante mergulho no universo de Ênio, um adolescente perturbado pela maneira distante, quase ausente, que seu pai o trata, e pelas constantes brigas na família. A pressão sobre o jovem beira o insuportável, pois além de estar no olho do furacão de toda esta tormenta familiar, Ênio ainda é “usado” pela sua mãe como espião do próprio pai. Até o momento em que algo se rompe – no protagonista, no filme, na vida, você decide – e o jovem mergulha nas profundezas de uma noite escura e tempestuosa onde realidade e vertigem serão misturadas.

É impossível não recordar de “Depois de Horas”, de Scorsese, a partir do momento em que o protagonista de “Ponto Zero” começa a empreender seu delírio noturno. Goulart, porém, opta por um clima mais soturno, explorando pavores e inseguranças, exorcizando pânicos, e levando tanto Ênio como a plateia a uma viagem desesperadora por uma noite sem fim. Pode ser uma noite, pode ser uma vida, o importante é que o diretor consegue imprimir na tela o clima exasperante de seu personagem. Trata-se de um exercício de estilo cruel e atraente, que mistura desde uma prostituta poeta até um motorista de ônibus vivenciando seu próprio limite. Tudo com belas imagens de uma plasticidade que tanto encanta quanto perturba.

Realizador de curtas antológicos, como “O Pulso” e, principalmente, “O Dia que Dorival Encarou a Guarda”, Goulart estava um pouco distante da direção cinematográfica, e este seu longa mostra que, felizmente, ele não perdeu a mão.

A estreia é em 26 de maio.