“QUERÊNCIA”: NEORREALISMO MINEIRO.

por Celso Sabadin.

Assisti a mais de meia hora de “Querência” pensando que era um documentário. Como, na medida do possível, tento ver um filme sem saber absolutamente nada sobre ele (trailer, então, nem pensar), não sabia que se tratava de uma ficção.

Esta percepção gradativa que o longa não é documental foi, ao meu olhar, absolutamente fascinante. Fiquei totalmente encantado pelo minimalismo da direção e pelo extremo naturalismo das interpretações. Com um mérito a mais: diferente do que se vê (ou se ouve) em vários filmes brasileiros recentes que buscam o naturalismo das interpretações, em “Querência” os diálogos são perfeitamente compreensíveis.

Rodado no interior de Minas Gerais, o longa estreou mundialmente no Festival de Berlim, e mostra uma pequena comunidade rural que vive o trauma de um grande roubo de gado acontecido na região. Neste cenário que une bucolismo e traumas, desponta o protagonista Marcelo (Marcelo di Souza),  vaqueiro que conta com a ajuda dos familiares e amigos para tentar realizar seu sonho de tornar-se um narrador de rodeios.

O filme propõe um intenso mergulho no universo rural brasileiro, oferecendo amplos e generosos enquadramentos que potencializam a imensidão sertaneja, fotografia caprichada, e importantes silêncios que embalam a narrativa. Além de – ufa! – não ter nenhuma locução em off.

Muito provavelmente “Querência” sofrerá algumas críticas por exibir o universo dos rodeios, duramente condenado por grupos de defesa dos animais, fato que não empana o brilho de uma das melhores direções que o cinema brasileiro exibiu este ano, se não a melhor.

O feito é de Helvécio Marins Jr. (também roteirista do filme), o mesmo de “Girimunho”, que no momento desenvolve seu terceiro longa: “Se vens por bem podes entrar, se vens por mal põe-te a cavar”, seu primeiro longa-metragem a ser rodado em Portugal.

Além de Berlim, “Querência” já passou pelos festivais New Horizonts Festival (Polônia), Festival de Cinema Latino-americano de Toulouse (França), IndieLisboa (Portugal) e Festival Internacional de Cinema Jeonju (Coreia do Sul), sendo neste último vencedor de Melhor Filme.

Estreou nos cinemas em 17/12.