SEGUNDO “JOGOS VORAZES” MANTÉM A QUALIDADE DO PRIMEIRO.

Lembro-me bem do impacto que me causou o filme francês “Le Prix du Danger” (nem eu nem o Imdb lembramos o título em português), que assisti, nos anos 80, no finado Cine Gazetão. Pela primeira vez (pelo menos para mim), alguém fazia um filme sobre uma cruel sociedade do futuro, onde a televisão transmitia um “reality show” (a expressão não existia na época) no qual os participantes se matavam uns aos outros, para o delírio da galera. Poucos anos depois, o cinema americano refilmou a ideia com Arnold Schwarzenegger, rebatizando-a de “O Sobrevivente”, e alegando se tratar de um roteiro baseado em obra de Stephen King, embora as semelhanças sejam muito grandes com o trabalho anterior de Robert Sheckley, que originou o filme francês. Mas isso é outra história.

De certa forma, o tema já havia sido explorado antes em “Rollerball”, de 1975, aventura futurística sobre um esporte violentamente imbecil cujos grandes índices de audiência ajudavam a alienar a população dos problemas reais. Isso mesmo, o UFC da época.
“Le Prix du Danger”, “O Sobrevivente” e “Rollerball” eram filmes que associavam a banalização da violência ao poder de alienação da televisão, de forma futurista. Como é fácil perceber, o futuro chegou, e o que era ficção científica virou documentário.

Fiz toda esta introdução para falar de Jogos “Vorazes: Em Chamas”, segunda parte da franquia iniciada no ano passado, que tem o tema bem parecido com tudo o que eu disse aí em cima. Eu já havia gostado bastante do primeiro filme, e esta sequência mantém o bom nível de seu antecessor. De acordo com o filme, no futuro, voltaremos as ser bárbaros, com o poder da mídia alienando a população que, assim, fica muito mais passível ser manipulada pelo governo autoritário e centralizador. Como se percebe, este futuro não é tão futuro assim. Na trama deste segundo episódio, a heroína Katniss (Jennifer Lawrence) está cada vez mais incomodada por ser obrigada a fazer o papel que o governo espera dela. A insatisfação popular é crescente e os tais Jogos Vorazes não parecem mais conseguir conter a ira dos habitantes empobrecidos. Como a revolução parece iminente, é preciso anular o efeito midiático de Katniss, e para isso o poder central reinventa autoritariamente as regras dos jogos. Sem direito a nenhum embargo infringente.

A crítica social é forte, a realização é brilhante, a engenhosidade dos momentos de perigo é criativa e o ritmo da ação é intenso. Fica somente aquele gostinho meio amargo de ser um filme sem fim, meio coito interrompido, que serve de plataforma de lançamento para o terceiro episódio que, claro, será dividido em mais dois filmes.
Afinal, não é só a “Capital” comandada pelo inescrupuloso Presidente Snow (Donald Sutherland) que usa o entretenimento para faturar em cima dos Jogos Vorazes.