Soldado de Deus

A primeira sensação é de estranheza. Soldado de Deus? Um documentário sobre o Integralismo? O braço brasileiro do Nazismo? Qual seria o interesse de se lançar um filme assim nos nossos cinemas? Passado o primeiro susto, vamos ao filme propriamente dito. A primeira imagem também me faz torcer o nariz: uma cena de alguma rua não especificada, provavelmente no Rio de Janeiro. Uma imagem escura, granulada, que parece ter saído diretamente da mais amadora das câmeras de VHS. Seria algo de valor histórico, de difícil recuperação? Nada disso. Trata-se de um momento atual. Um travelling nos leva até um pequeno apartamento desta tal rua, onde ficamos sabendo se tratar da antiga moradia de Plínio Salgado, o fundador do Integralismo. Ali acontece uma reunião de pessoas – alguns jovens – que ainda cultuam a doutrina. A partir daí, o filme Soldado de Deus começa a ficar mais interessante. Particularmente, eu não tinha a mínima idéia que o Integralismo ainda tinha adeptos. E muito menos que faziam reuniões. Alguns dos presentes prestam seus depoimentos de simpatia ao movimento, e logo em seguida entram os créditos de abertura.
Pena que após estes letreiros Soldado de Deus assuma uma postura cinematograficamente conservadora. Longos depoimentos – nem sempre esclarecedores – são mesclados a algumas imagens de arquivos de relativo interesse. Em determinado ponto do filme ensaia-se uma locução em off das mais antiquadas, idéia felizmente abandonada no transcorrer do próprio filme. Há erros básicos (facilmente corrigíveis) como deixar alguns dos depoentes sem identificação, e grafar errado por duas vezes o nome do ex-presidente Médici, que no filme sai como “Médice”. Uma das depoentes é identificada como “A mais importante do Integralismo”. Mas importante o quê? E há outros problemas mais difíceis de serem consertados, como a baixa qualidade da imagem e do som. Há cenas em que se ouve melhor a pista de áudio de um filme histórico de 70 anos atrás, que a própria captação do som de depoimentos atuais. Ah, e a boa idéia de documentar o pensamento dos atuais seguidores do Integralismo, apresentada bem no início do filme, é simplesmente esquecida e descartada.
Há acertos também, como a imparcialidade com a qual o tema foi tratado (felizmente não é uma apologia da Direita), e a contribuição histórica que o filme possa fornecer ao radiografar um tema considerado tabu.
Soldado de Deus marca a estréia no longa-metragem do cineasta Sérgio Sanz, antigo assistente de Ruy Guerra.