“SOLDADOS DA BORRACHA”, UM HOLOCAUSTO TROPICAL.

Por Celso Sabadin.
É incrível como todo e qualquer filme sobre as injustiças, desmandos e maracutaias perpetradas no Brasil de antigamente ganham – neste atual desgoverno lunático – proporções contemporaneamente avassaladoras. É o caso de “Soldados da Borracha”, genial documentário selecionado para esta 24ª edição do Festival É Tudo Verdade.
 
O longa é basicamente dividido em duas partes que conversam muito bem entre si. Na primeira, de maneira didaticamente clara e cinematograficamente eficiente, o roteirista e diretor Wolney Oliveira esmiúça com olhar histórico a questão que dá título ao filme, qual seja, sobre os mais de 50 mil brasileiros egressos primordialmente do nordeste que, durante a 2ª Grande Guerra, se dispuseram a mudar radicalmente de vida para se tornarem seringueiros na região norte. Tal êxodo interno foi motivado por pressões do governo norte-americano que naquele momento estava extremamente necessitado da borracha produzida no Brasil para suprir seu arsenal bélico. Afinal, sem borracha, não há pneus para aviões e carros, botes, nem uma série infindável de peças para as máquinas de guerra.
 
Como o filme bem demonstra, Roosevelt pediu (mandou) e estava disposto a pagar bem pela encomenda humana. Getúlio aceitou, recebeu, e o dinheiro jamais chegou aos chamados soldados da borracha, que definhavam esquecidos por tudo e por todos em meio à Amazônia. Dados do longa informam que dos 50 mil, mais de 30 mil morreram por falta de condições de trabalho, higiene e saúde. “Quase um genocídio”, afirma o escritor e historiador Lira Neto em depoimento ao filme. Eu tiraria o “quase”.
 
Como se o tema já não fosse inquietante o suficiente, “Soldados da Borracha” vai além. Num segundo momento de sua narrativa, abandona o enfoque meramente histórico e fixa-se na situação atual dos sobreviventes deste holocausto tropical. Nela, a política e a politicagem continuam sendo os grandes algozes do povo. Tanto ontem como hoje (e, ao que parece, sempre), estaremos sujeitos e subjulgados a governos dos mais corruptos, que fazem questão de tornar intransponível e gigantesco abismo social que separa as classes dominantes das dominadas. Para que as dominadas jamais deixem de assim ser.
 
“Soldados da Borracha” é um trabalho obrigatório para quem deseja entender este cada vez mais incompreensível Brasil de hoje. Imprescindível e emocionante.
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