“SOLDADOS DO ARAGUAIA”, PARA INFORMAR MELHOR QUEM AINDA PEDE INTERVENÇÃO MILITAR.  

Por Celso Sabadin.

Muito já se escreveu, se falou e se filmou sobre a Guerrilha do Araguaia. Muito. Mas nunca o suficiente. Enquanto existir pelo menos um brasileiro desinformado que ainda acredite que “na época da ditadura era melhor”, temas como estes precisam ser martelados.

O documentário “Soldados do Araguaia”, de Belisario Franca, vem jogar outras luzes sobre o assunto, desta vez colhendo informações preciosas junto aos militares que participaram da operação. Não militares de patentes mais altas, responsáveis diretos pelas torturas e assassinatos, mas sim soldados rasos que, de acordo com seus próprios depoimentos, foram tirados de suas casas a força e arrastados para a região da Guerrilha sem nenhum tipo de informação ou treinamento. E se depararam com um horror que assombra suas vidas até hoje.

Nos testemunhos, chama a atenção o sadismo dos comandantes da operação que, antes de matar os guerrilheiros, proporcionavam a eles banho, roupas limpas e desodorante, alegando que iriam ser levados a “Brasília”. A capital do país era apenas o apelido de uma cachoeira das imediações, na qual os guerrilheiros eram atirados de helicóptero, ainda vivos.  Há relatos também de sacos repletos de cabeças humanas que os soldados eram obrigados a, de alguma forma, descartar. Tais soldados eram ainda amarrados ao chão, cobertos de açúcar, em plena mata, para que pudessem ser picados e ferroados horas a fio pelos mais diversos tipos de insetos. O motivo? “Treinamento”.

O filme aborda ainda o projeto Clínica do Testemunho, que dá assistência psicológica a afetados pelas políticas violentas do estado brasileiro entre 1946 e 1988, e que teve a adesão de cerca de 100 ex-militares, das três armas, em busca de tratamento.

“Soldados do Araguaia” dá sequência à  Trilogia do Silenciamento, um projeto de Belisario Franca que busca recuperar histórias e personagens brasileiros que vivem à margem da historiografia nacional. O primeiro filme da trilogia foi o premiado Menino 23, lançado em 2016.  “Vivemos num tempo em que muitos alimentam a ideia de que “o melhor para a sociedade é dirigir o olhar para o futuro”, para fazer do silêncio sobre o passado uma norma. Essa postura é ingênua e entrega nossos destinos nas mãos de quem quer fazer prevalecer versões edulcoradas da realidade brasileira. Ao examinarmos a situação do Brasil, que saiu da ditadura sem que o tempo de violações tenha sido suficientemente passado a limpo, verificamos que ele está entre os países que mantêm um alto padrão de violência. Ser a nação que prefere a negação — do racismo, da violência, do machismo, do extermínio das populações indígenas — permite a perpetuação dessas práticas”, afirma o diretor Belisario Franca.

Obrigatório, o filme estreia em 22 de março.