TALENTO DE FREARS DÁ CONSISTÊNCIA E BRILHO A “PHILOMENA”.

Digamos que… meio que era difícil dar errado. Uma história real de uma mulher violentada pela Igreja Católica que decide se livrar de um silêncio de 50 anos e sai à procura do filho que lhe foi roubado pelas freiras. Material fantástico para um ótimo filme. Junte-se a isso a direção de Stephen Frears e a interpretação de Judi Dench no papel principal.
É. “Philomena” não tinha com dar errado. E realmente não deu. O que chama a atenção, porém, é o excelente trabalho de Steve Coogan, que não apenas é o protagonista masculino principal, como também assina a produção e o roteiro do filme (junto com Jeff Pope). Nada contra Coogan, que tem se mostrado um eficiente roteirista (principalmente em TV) e quase sempre funciona nos papéis que interpreta. Mas talvez poucos pudessem supor que ele teria estatura para capitanear uma obra deste porte. Mas teve.

Aqui, Coogan vive o papel real de Martin Sixsmith, um ex-relações públicas do gabinete do primeiro ministro britânico Tony Blair, que acaba de perder seu emprego. Sem saber exatamente que rumo tomar na vida (“escrever um livro sobre a história da Rússia, talvez”), Martin se interessa pela história de Philomena (Judi Dench perfeita, com o perdão da redundância), uma enfermeira aposentada à procura do filho. Logo nas primeiras cenas já nos é mostrado o drama da protagonista: adolescente, grávida na conservadora Irlanda católica, ela é internada num convento para dar à luz. Ali, além de ser obrigada a trabalhar para as freiras, seu pequeno filho é cruelmente colocado para adoção, à revelia da mãe. Atormentada pelo que ela acredita ser pecado, Philomena engole seu segredo por meio século, mas agora quer encontrar seu filho a todo custo. Para isso, ela precisa da ajuda de Max, que pretende transformar toda esta historia num livro. O que acaba realmente fazendo: “The Lost Child of Philomena Lee”, lançado no Brasil apenas como “Philomena”.

O filme mostra a trajetória desta procura. E, sim, estruturalmente ele traz o que esperamos deste tipo de produção cinematográfica. A busca, o arco dramático que acaba unindo protagonistas a princípio diferentes entre si, a redenção. Mas com um porém: tudo muito bem urdido pelo talento da direção de um Stephen Frears, o mesmo de “A Rainha”, “Alta Fidelidade”, “Ligações Perigosas” e tantos outros. O resultado do trabalho de Frears é altamente qualificado e equilibrado: há humor, deliciosos diálogos ácidos, excelentes interpretações proporcionadas pelos sempre excepcionais atores britânicos, e drama na medida certa.

O tema proporcionaria um melodrama choroso, o que felizmente não acontece. Há uma opção maior pela discussão religiosa (potencializada pelo fato da trama envolver um inglês e uma irlandesa), pelo desenvolvimento humano da dupla central de protagonistas, sobrando tempo até para uma rápida denúncia contra o governo Reagan e sua omissão no combate a Aids.

Mais um belo trabalho para enriquecer as filmografias de Frears e Dench, e firmar com louvor a de Coogan.