TORNATORE, SEMPRE ENCANTADOR, E O SEU “O MELHOR LANCE”.

Já escrevi isso em outras ocasiões, mas vale a pena lembrar: poucas coisas são piores na vida de um cineasta que fazer um filme inesquecível. Motivo: seus próximos trabalhos, por melhor que sejam, sempre serão “piores” que o inesquecível. Assim foi com Orson Welles em “Cidadão Kane”, Anselmo Duarte em “O Pagador de Promessas” e Giuseppe Tornatore em “Cinema Paradiso”, só para citar três exemplos.

A sina se repete agora com o lançamento de “O Melhor Lance”, o mais recente trabalho de Tornatore. Trata-se de um suspense dos mais interessantes e envolventes… mas se comparado à “maldição de Cinema Paradiso”…
O filme mostra Virgil Oldman (o sempre ótimo Geoffrey Rush), um respeitadíssimo e extremamente competente leiloeiro que vive exclusivamente para as artes. Seu regrado cotidiano vira de cabeça para baixo quando ele recebe a proposta de avaliar uma grande coleção de obras de arte de uma estranha colecionadora que prefere se manter oculta e anônima. O mistério que a mulher constrói em torno de si própria acende em Virgil sentimentos que ele julgava há muito enterrados.
Tornatore é um elegante estilista do cinema. Logos nos primeiros momentos ele nos brinda com uma bela cena onde se vê a espuma de uma bebida que, subindo pelo copo, revela que o protagonista é tão exclusivista que tem sua própria louça marcada com seu monograma, em seu restaurante favorito. Uma daquelas breves imagens que dizem mais sobre o personagem que as famosas mil palavras.

É esta habilidade em criar imagens e sons, esta fina ourivesaria cinematográfica, que transforma todos os filmes do diretor numa experiência especial. Mesmo que às vezes o roteiro se perca um pouco, é um prazer se deixar levar por ele, como quem se perde por misteriosos becos de uma bela cidade.
Sim, “O Melhor Lance” por vezes lança mão de algumas referências um pouquinho óbvias demais, como o boneco autômato sendo montado enquanto o protagonista se transforma. Mas não deixa de ser interessante sair em busca dos pequenos quebra-cabeças propostos durante o filme, como o próprio nome do personagem (“Virgil Oldman” seria um “velho virgem”?) ou mesmo o seu cabelo pintado, que o colocaria em pé de igualdade com alquilo que ele mais domina no mundo das pinturas: uma falsificação.

E o que dizer de uma bizarra anãzinha que nunca se esquece de nada? Uma referência ao estilo de David Lynch?
Na verdade não importa. Importa sim que Tornatore propõe uma viagem que fica entre o fantástico e o apaixonante, que envolve o público num crescente clima de suspense, emoldurando tudo com seu impecável e charmoso estilo visual.
E como se tudo isso não bastasse, como é bom ouvir Ennio Morricone, mesmo com alguns de seus temas sugerindo uma “requentada” de “Era uma Vez na América”.

“O Melhor Lance” obteve um grande sucesso no David Di Donatello 2013, ganhando os prêmios de Melhor Filme, Direção, Música, Figurino e Desenho de Produção.