UM CROISSANT PARA QUEM CONSEGUIR NÃO CHORAR EM “PIAF”

Prepare seus lenços. Vai ser praticamente impossível não derramar pelo menos algumas lágrimas durante os 140 minutos de projeção de “Piaf – Um Hino ao Amor”, a festejada cinebiografia da cantora francesa Edith Piaf. O drama já levou mais de 5 milhões de franceses aos cinemas de seu país, além de faturar US$ 10 milhões nos EUA, mercado que costumeiramente foge de filmes legendados como o Bush da Cruz.
O sucesso é coerente. Co-produzido por França, Inglaterra e República Checa, “Piaf” é rasgadamente emotivo e emocional, atingindo em cheio o grande público, da mesma forma emotiva e emocional que a própria cantora tinha de conquistar as suas platéias. E importante: sem cair no piegas.
O roteiro da estreante Isabelle Sobelman, em parceria com Olivier Dahan – este também diretor do filme – opta por uma narrativa que une equilibradamente fatores conservadores com alguns elementos mais arrojados. Se, por um lado, “Piaf” se aproxima, estruturalmente, a outras grandes cinebiografias clássicas de músicos e cantores famosos, como “Ray” ou “Amadeus”, por exemplo, por outro lado é bem-vinda a montagem não cronológica, que joga eficientemente com a linha do tempo da personagem, ao mesmo tempo em que exige do público uma atenção – e um conseqüente envolvimento – mais próximo.
Nos quesitos técnicos, o”Piaf” é irrepreensível. A fotografia escura e sombria de Testsuo Nagata, aliada a uma impecável reconstituição de época (no caso, de épocas, já que o filme transita em várias décadas), dão à produção ares de luxo e imponência, ao mesmo tempo em que criam uma aura de autenticidade fundamental para que o público entre de cabeça na história da cantora, comprando o que vê na tela como a mais pura realidade.
A sempre difícil maquiagem de envelhecimento, desta vez beira a perfeição. E a trilha sonora tem o grande mérito de não ser óbvia, utilizando as mais famosas canções de Piaf de forma comedida e precisamente colocada dentro de cada cena, sem os exageros que são quase sempre inevitáveis no caso do biografado estar ligado ao mundo da música.
Ambicioso, “Piaf” ousa retratar a vida da estrela por inteiro. De seus primeiros e extremamente pobres anos de vida, suas perambulações por cabarés e prostíbulos, a descoberta do talento natural, a lapidação deste talento, o sucesso, a ida aos Estados Unidos (numa Nova York totalmente feita em estúdio), os amores, até chegar à sua doença, que a atormentou e consumiu ainda bastante jovem.
Deixamos, porém, o melhor para o final: a interpretação da atriz parisiense Marion Cotillard no papel título. De coadjuvante quase imperceptível em filmes como “Um Bom Ano” (com Russell Crowe), “Peixe Grande” ou na trilogia “Táxi”, Marion se agiganta como Piaf, estoura na tela grande, dá alma ao personagem e se transforma de maneira impressionante a cada fase diferente de sua vida. Certamente receberá vários prêmios importantes durante a carreira do filme, que estreou em fevereiro deste ano na França e, conseqüentemente – concorrerá ao César (e talvez até ao Oscar) de 2008.
Uma última informação: cinematograficamente, “Piaf” apresenta pelo menos uma cena que já pode ser considerada antológica. Para quem não viu o filme, convém não contar para não estragar o momento, mas vale dizer que é um instante magnífico onde a personagem principal recebe uma notícia terrível, e – no mesmo plano – exorciza a tristeza através de uma música composta a partir de uma carta de amor que ela própria escreveu. Só vendo.

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Piaf – Um Hino ao Amor (La Môme/ La Vie en Rose). França/ Inglaterra/ República Tcheca 2007.
Direção de Olivier Dahan.
Com Marion Cotillard, Sylvie Testud, Pascal Greggory, Emmanuelle Seigner, Jean- Paul Rouve, Gérard Depardieu.
Distribuição: Europa
Estréia: 12 de outubro.