“UMA VIDA: A HISTÓRIA DE NICHOLAS WINTON” E A IDEIA DE PROTAGONISMO.

Por Gustavo Meca.

Imagino que o maior problema de “Uma Vida: A História de Nicholas Winton” seja não achar uma maneira coerente de posicionar seu protagonista frente às dores e aos acontecimentos retratados. Apesar do subtítulo intencionado, é difícil não perceber problemas em como as hierarquias de emoções e representações são trabalhadas no filme.

Nicholas Winton, interpretado por Anthony Hopkins e Johnny Flynn (na versão jovem), obviamente é o condutor central da história, mas com uma clara diferença entre as passagens de passado e presente. Durante a Segunda Guerra, Winton se depara com uma situação angustiante e miserável com famílias e crianças em Praga, na Tchéquia, devido à invasão nazista na época. Nos mesmos moldes de vários filmes sobre o Holocausto Judeu, vamos aos poucos acompanhando os feitos de Winton, que, junto de várias pessoas e articulações, resgatam mais de 600 crianças da iminência de Hitler no país, levando-os para uma adoção temporária no Reino Unido. Paralelo a isso, o filme retrata o drama de Winton no presente, que encontra-se em dúvida sobre seu legado, buscando entender como sua posição de salvador frente aos seus feitos pode ser divulgada para estudos, a mídia e a sociedade.

Ainda que o personagem mostra-se um pouco incomodado com possíveis elevações desse heroísmo, o filme dificilmente toca em outra tecla a não ser colocar as crianças em função das suas atitudes particulares. É aí que a diferença nos tempos do filme fica mais evidente. No presente, as cenas assumem um tom bem mais contemplativo e de realmente representar possíveis construções dramáticas de Winton, que se relacionam com o passado por meio de momentos mais significativos e profundos, em termos de imagem, composição e montagem. Contudo, no passado, as situações soam bem mais ágeis, no que buscam mostrar realisticamente todos os fatos da história e os sentimentos que permeiam aquele momento, mas de fato nada funciona. A presença dos atores é quase nula, ainda mais pensando que eles estariam absorvendo toda possível concentração de emoção das crianças, que são postas de forma genérica e impessoal. Além disso, é quando o filme expõe suas fragilidades técnicas, com composições e sequências extremamente comuns e televisivas, que tentam criar um ambiente “bonito” no contraste e nas cores, soando apenas contrário ao fato representado e um tanto insensível e desmedido (pensando novamente na hierarquia que o filme pensa de protagonismo).

É inegável, então, essa postura complicada que o filme assume, intencional ou não, de tornar o protagonismo de Nicholas Winton numa situação naturalmente mais importante que qualquer drama ou realidade das crianças que ele mesmo salva. Isso nem vem à tona no sentido de julgar em como a atitude foi importante para a historicidade desse nobre ato articulado por Winton e sua equipe, mas sim sobre como a representação do contexto pode abrir brechas para consequências às vezes problemáticas.