“YORIMATÔ REVIVE A BELA UTOPIA ALTERNATIVA DOS 70.

Por Celso Sabadin.

Grande vencedor do Festival In-Edit Brasil 2015, onde ganhou os prêmios de Melhor Filme tanto pelo júri oficial como pelo público, “Yorimatã” é bem mais que um documentário musical. Ele é uma história de vida.

Com direção do estreante em longas Rafael Saar, o filme traça um panorama histórico-musical da dupla de cantoras e compositoras Luhli e Lucina, nomes marcantes do cenário musical alternativo brasileiro dos anos 70 e 80. Alternativo. Talvez seja esta a palavra condutora não só do filme como, principalmente, da maneira de viver muito especial da dupla.

Era uma época de transições. Se, por um lado, a contracultura dos anos 60 já dava sinais que estava sendo absorvida pelas forças destrutivas do mercado, por outro lado o cinismo monetarizado que marcaria os 80 ainda não havia se instalado definitivamente na vida social, artística e musical do Brasil. Restavam ainda alguns espaços de conquista alternativa, espaços estes que Luhli e Lucina decidiram ocupar com feroz determinação pacífica.

É marcante, no filme, o relato do momento em que a dupla é informada que, inadvertidamente, foi contratada por determinada gravadora com a única finalidade de ser colocada na “geladeira” do mundo musical. A estratégia era tirá-las do caminho dos “Novos Baianos”, que haviam assinado com a mesma empresa. Foi a gota. Luhli e Lucina decidiram jogar tudo para o alto para criar uma pequena, verdadeira e revolucionária sociedade alternativa, ao lado do fotógrafo Luiz Fernando Borges da Fonseca, marido das duas. Como? O filme explica.

Dividir suas vidas com um fotógrafo fez com que esta trajetória de sons, sentimentos e imagens dos três ganhasse farta documentação. É no mínimo preciosa a quantidade e a qualidade de material de arquivo que o longa traz, não apenas de shows da dupla, como principalmente de ternos registros desta nada ortodoxa vida em comum.

“Yorimatã” também acerta em cheio ao não se render à regra não escrita do mercado exibidor que documentário deve ser curto. As suas quase duas horas de projeção são necessárias e muito bem-vindas para que o filme possa brindar o público não somente com trechos da vasta, belíssima (e pouco conhecida do grande público) obra da dupla, como também com algumas de suas canções saboreadas na íntegra, deliciosamente sem pressa, sem a ansiedade dos cortes rápidos da linguagem televisiva. “Yorimatã” é puro cinema.

Com direito a registros e depoimentos com Ney Matogrosso, Joyce Moreno, Gilberto Gil, Tetê Espíndola, Alzira Espíndola, Zélia Duncan, Antonio Adolfo e Luiz Carlos Sá, entre outros.