ANIMA MUNDI E SESSÃO VITRINE: DOIS CASOS DE RESISTÊNCIA.

Diante de tantas notícias negativas para o setor cultural, pelo menos duas ótimas iniciativas proporcionaram, esta semana, algum alento a este mercado tão atacado pelas forças conservadoras. Com poucos dias de diferença entre si, , anunciaram-se as continuidades do Festival Anima Mundi e do projeto Sessão Vitrine, ambos até então ameaçados de descontinuidade em função de problemas com patrocinadores abalados pela imbecilidade direitista que assola o país.

SESSÃO VITRINE

Uma das iniciativas mais importantes na formação de público do cinema brasileiro, a Sessão Vitrine resiste e se mantém forte, apesar de perder seu principal patrocinador. Num momento turbulento das políticas públicas do segmento cultural do país, o projeto reforça o seu compromisso com o setor audiovisual, democratizando o acesso ao grande público através da oferta de múltiplas telas. Lançado em 2011, com a proposta de levar filmes nacionais aos cinemas de todo o Brasil, com ingressos a preços acessíveis, a Sessão Vitrine, que já soma um total de 200 mil espectadores em suas quatro edições, volta em 2019 com uma série de novidades no formato e na programação.

“Este é um  momento muito interessante no cinema nacional. Primeiro, pela quantidade de filmes produzidos no Brasil, e segundo, pela qualidade dos filmes que estão sendo reconhecidos mundialmente. Por outro lado, vivemos momentos de incerteza e de questionamento da produção cultural como um todo. São momentos como este que proporcionam oportunidades de refletirmos, repensarmos e nos reinventarmos”, diz Silvia Cruz, Diretora Geral da Vitrine Filmes.

Nesta nova fase, as estreias ocorrerão simultaneamente nas salas de cinema e nas plataformas digitais, a partir da parceria com a Sofá Digital, maior agregadora de VOD (Vídeo por Demanda) da América Latina. Os filmes estarão disponíveis para compra e locação no Apple TV, Google Play/YouTube Premium, Now e Vivo Play. Além disso, o serviço de recomendação Filmmelier divulgará os lançamentos, com o uso de ferramentas de inteligência artificial e big data.

“A Sessão Vitrine tem um caráter inovador desde sua concepção e analisa os dados de mercado para encontrar as melhores estratégias de lançamento. Deste modo, as estreias desta edição serão silmultâneas nos cinemas e nas plataformas digitais, trabalhando o conceito de múltiplas telas, de olho nas novas formas de consumo. O objetivo é atingir o maior número de espectadores nacionalmente”, afirma Talita Arruda, coordenadora da Sessão Vitrine.

A edição de 2019 começa no dia 11 de julho, com o lançamento do longa-metragem “Estou me guardando para quando o carnaval chegar”, do premiado cineasta Marcelo Gomes (“Cinema, aspirinas e urubus”, 2005) , o primeiro de 10 produções, além de uma sessão de curtas-metragens. Todos os lançamentos incluirão sessões seguidas de debates e serão exibidos nas salas de 20 cidades, sendo uma estreia a cada mês, com ingressos a R$ 15 (inteira) e R$ 7,50 (meia-entrada).

Para promover a difusão dos filmes que fizeram parte das edições anteriores do projeto, foram firmadas duas novas parcerias: com a Mubi, plataforma de streaming focada em filmes de arte, e com o Videocamp, ferramenta que viabiliza sessões sob demanda em locais não atendidos pela distribuição comercial.

PROGRAMA NOVOS CLÁSSICOS DO CINEMA BRASILEIRO

Pela primeira vez, a Sessão Vitrine anuncia, em parceria com o BR Lab e coprodução com Canal Brasil, o Programa Novos Clássicos do Cinema Brasileiro, no qual estará à frente da produção de um longa-metragem original – de baixo orçamento e assinado por um(a) realizador(a) estreante em longas – desde o desenvolvimento do roteiro até a sua distribuição nas telas.

Depois de aprovado, a partir de uma decisão curatorial e mercadológica, a Sessão Vitrine, em conjunto com o Canal Brasil, aportará o valor necessário para a sua produção através do PRODAV 06 do Fundo Setorial do Audiovisual. O projeto contemplado nesta edição foi a ficção “As Criadas”, de Carolina Rodrigues, da produtora Gato do Parque. A escolha dos filmes se caracteriza pelo investimento em um audiovisual descentralizado, de gêneros narrativos distintos, com temáticas plurais e afirmativas, para a construção de um cinema mais sustentável e diversificado.

Esta edição conta ainda com a parceria do Projeto Paradiso, iniciativa do Instituto Olga Rabinovich, que oferece bolsas e outros apoios para talentos do audiovisual, contribuindo na formação e capacitação destes profissionais. Será desenvolvida uma rede de monitores locais que atuarão na divulgação institucional da Sessão Vitrine, bem como dos filmes ao longo do ano.

O PROJETO PARADISO

Mantido pelo Instituto Olga Rabinovich, oferece bolsas e mentorias para profissionais do audiovisual, com foco na criação de grandes histórias conectadas com seus públicos. Atua por meio de parcerias com instituições de referência no Brasil e no exterior.

 

ANIMA MUNDI

Depois de uma campanha de financiamento coletivo que terminou na última quinta-feira, 27 de junho, o Anima Mundi, um dos maiores festivais de animação do mundo, confirma que realizará sua 27ª edição, que acontece de 17 a 21 de julho no Rio de Janeiro, e de 24 a 28 de julho, em São Paulo. Serão 303 filmes de mais de 40 países, incluindo 89 produções ou coproduções do Brasil, espalhados em cinemas e centros culturais das duas cidades.

As mostras competitivas serão divididas por categorias: Curtas (79 filmes), Curtas-metragens documentário (6), Curtas infantis (33), Galeria (19 filmes experimentais), Portfólio (26 filmes publicitários ou feitos sob encomenda) Longa-metragem (4), Longa-metragem infantil (4) e Realidade virtual (15).

Já as mostras não-competitivas serão classificadas em: Panorama Internacional (27 curtas internacionais que apresentam diversas tendências dentro da animação), Animação em Curso (36 trabalhos finais das melhores escolas de animação do mundo), Olho Neles! (24 curtas nacionais que merecem atenção) e Futuro Animador (29 filmes que utilizam as linguagens da animação para experiências educativas).

A programação inclui ainda as oficinas do Estúdio Aberto, o Papo Animado, e o Anima Forum, que esse ano será sediado em São Paulo, com uma programação voltada ao fomento, profissionalização e internacionalização do mercado de animação. Os detalhes dessas programações serão divulgados em breve.

“A beleza plástica que as imagens dos filmes apresentam nesta edição é impressionante. Percebemos os animadores com um total domínio dos softwares, utilizando-os como ferramenta para simular perfeitamente os mais variados materiais artísticos, ultrapassando os limites impostos pelo universo digital. Observamos esses destaques durante o processo de seleção, uma das primeiras etapas da pré-produção que nesta edição ocorreu dentro da normalidade possível, já que ainda não tínhamos o quadro de patrocínio definido e não podíamos esperar o final da campanha de financiamento coletivo para isto. E agora vamos conseguir realizá-lo dentro da data prevista”, explica Aída Queiroz, uma das diretoras fundadoras do festival ao lado de Cesar Coelho, Lea Zagury e Marcos Magalhães, responsáveis pela curadoria do Festival desde 1993, data de sua criação.

“Uma das categorias mais originais e significativas do festival, a meu ver, é a que se chama Futuro Animador. São programas gratuitos nos quais a gente se contagia com o frescor e o entusiasmo de crianças, jovens e educadores, independentes ou participantes de diversas iniciativas de todo o mundo, que descobrem o quanto a linguagem da animação pode ser transformadora. É uma tendência que vem crescendo em número e qualidade. Este ano temos filmes interessantíssimos feitos em escolas e oficinas não profissionalizantes do Brasil, Argentina, Bélgica e Portugal, por exemplo”, conta Marcos Magalhães.

“Também estamos com uma excelente competição de longas metragens de animação, refletindo o aumento da produção deste formato em todo o mundo.  Vale ressaltar os longas para adultos, uma tendência de mercado cada vez mais forte. Nesta categoria teremos grandes filmes em competição, incluindo o longa brasileiro de Otto Guerra, “Cidade dos Piratas”. “Another Day of Life” tem o diferencial de ser um documentário realizado em grande parte em animação.  A categoria de longas infantis também não fica atrás em termos de qualidade e também inclui um filme brasileiro na competição, “Miúda e o Guarda-Chuva”. Destaco o longa “Away”, da Letônia, animado totalmente por seu diretor, um trabalho impressionante, tratando-se de um longa de animação”, aponta Cesar Coelho.

“Desde seu início, o festival se preocupou em mostrar filmes de autor, que por sua natureza, não têm como objetivo um apelo comercial. As narrativas são mais pessoais, íntimas e experimentais e se destacam mais no universo da animação de festivais internacionais, escolas de cinema e museus contemporâneos. Na Sessão Galeria apresentamos as obras mais experimentais, mas que inspiram a muitos pela forma nova de pensar, interpretar e inovar. Alguns filmes de autor se desenvolveram também além da tela, e navegaram por galerias de arte e museus em novos formatos como instalações, performances e mais recentemente, e assim como alguns estúdios de animação, abraçaram a linguagem de VR”, destaca Lea Zagury.

A última edição do Anima Mundi, em 2018, movimentou R$ 26,8 milhões e gerou R$ 2,6 milhões em impostos, tendo público estimado de 50 mil pessoas. Desde a criação, exibiu mais de 10 mil filmes de animação do mundo inteiro a preços populares, entre longas e curtas-metragens, além de promover oficinas abertas e gratuitas, debates, exposições, entre outras atividades.

Desde 2012, o Anima Mundi é qualificado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos EUA e o curta-metragem vencedor do Grande Prêmio Anima Mundi é elegível a participar das seleções para a disputa do Oscar®. Neste ano, “Animal Behaviour”, de David Fine, ganhador do Grande Prêmio de 2018, concorreu ao Oscar de melhor curta-metragem de animação.

“Em 2019, a união do setor por meio dos canais de exibição de animação, estúdios, produtoras, instituições de ensino e animadores independentes foi um grande diferencial para a realização do festival, depois da perda de importantes patrocínios. Parceiros como Cartoon Network, Gloob, Band,  TV Escola, Birdo, Copa Estúdio, Paris Filmes, 2dLab, Turma da Mônica, TV Pinguim, Combo, Split e Boutique Filmes apresentarão conteúdos inéditos no Festival. As Instituições Culturais, como Itaú Cultural e Centro Cultural Banco do Brasil, que irão receber o Festival, foram fundamentais para levantarmos nossa produção. Com certeza sem esse movimento não estaríamos celebrando a 27ª edição do Anima Mundi”, explica Fernanda Cintra, diretora executiva do festival.

Há atividades gratuitas e outras pagas. A seleção de filmes e a programação completa ficarão disponíveis no site do festival.