CINE CEARÁ EXIBE “A ESTRADA 47″.

Por Celso Sabadin

Sempre defendi a ideia que a História do Brasil é uma fonte inesgotável de boas ideias para o nosso cinema. “A Estrada 47” vem me ajudar a defender este raciocínio. Não que o filme seja baseado exatamente num fato real e pontual, mas sim ambientado numa situação da nossa história nem sempre valorizada (ou até mesmo compreendida) pelo grande público: a participação do Brasil na 2ª Guerra Mundial.
Dirigido por Vicente Ferraz, “A Estrada 47” narra o desespero de um grupo de soldados brasileiros que durante a Guerra se perdem nos gelados campos italianos, sem rumo nem comando. Pelo caminho, encontram dois desertores – um italiano, e um alemão – e terão de reescrever a guerra à sua maneira.

Como o próprio diretor Vicente Ferraz, afirmou, “não é um filme de guerra”. É muito mais que isso. Trata-se de um emocionante drama de seres humanos colocados numa situação limite. Homens que lutam num conflito que pouco ou nada lhes diz respeito, jogados crua e cruelmente na hostilidade de um ambiente que mal compreendem.

A produção é das mais competentes, incluindo indispensáveis locações na Itália. Neve e lama emoldurando o desespero dos protagonistas potencializam o clima de desolação e desconsolo que toda e qualquer guerra proporciona. A eficiente direção de elenco coloca todos os atores num mesmo (e elevado) patamar: não há protagonistas, nem coadjuvantes. E, juntos, eles conseguem passar para o público a sensação de solidariedade e união tão necessária para que haja empatia com a plateia. É impossível não torcer pelos personagens, e o clima de tensão obtido pela direção é consistente e constante.

O filme chega num momento dos mais oportunos, onde se discute o velho e crônico “complexo de vira-latas” do povo brasileiro, tão bem diagnosticado por Nelson Rodrigues. Os brasileiros de “A Estrada 47”, num primeiro momento combalidos e até ridicularizados por um ataque de pânico, buscam forças que sequer sabiam existir para virar um jogo que se julgava perdido antes mesmo de começar. Talvez a história que o filme conta não seja tão anos 40 como se pode pensar, e certamente esta eterna disposição da nossa cultura de buscar forças para se reinventar seja um dos fortes traços do nosso DNA. Afinal, como diz a Canção do Expedicionário, que fecha o filme, “por mais terras que eu percorra, não permita Deus que eu morra sem que eu volte pra lá”.

Este é o primeiro longa de ficção (embora com um pezinho no documentário) dirigido por Ferraz, que já havia feito o instigante documentário “Soy Cuba, o Mamute Siberiano”. No elenco, interpretações irretocáveis de Daniel de Oliveira, Francisco Gaspar, Richard Sammel, Sergio Rubini, Julio Andrade, Ivo Canelas e outros.

Coproduzido por Brasil, Itália e Portugal, “A Estrada 47” é um belíssimo filme que merece ser visto com carinho, atenção e coração aberto.