CINEMA É MUITO MAIS DO QUE APENAS VER UM FILME.
Já repararam? De alguma forma, as pessoas parecem querer “estar juntas” novamente. Só nos últimos dias pudemos acompanhar pela imprensa o grande sucesso da Bienal do Livro, do Salão do Imóvel e do Festival de Cinema do Rio de Janeiro. Eventos que arrastaram dezenas de milhares de pessoas para um convívio em comunidade.
Eu ficava pensando o que faz uma pessoa enfrentar filas e multidões para – sei lá – comprar um livro na Bienal. Não tem livro em qualquer livraria? Os preços não são os mesmos? Se eu comprar pela internet consigo até prazos de pagamento melhores. E porque esperar um tempão para ser atendido num Salão, para comprar um imóvel? Qualquer imobiliária poderia me proporcionar o mesmo serviço. O mesmo acontece com os chamados feirões de automóveis. É fato: os preços dos feirões são os mesmos de qualquer concessionária da mesma marca. E, às vezes, o preço é até melhor numa compra via web.
No Festival de Cinema do Rio de Janeiro (e na mostra paulistana, que acontecerá em novembro) ocorre a mesma coisa: filas e multidões para assistir a filmes que – sabidamente – entrarão em cartaz nas próximas semanas, sem confusões nem atropelos.
Ficava com isso na cabeça: por que enfrentar tantas filas e multidões por serviços e produtos que podemos ter, com os mesmos benefícios, no aconchego do nosso terminal de computador? Depois de um tempo refletindo (adoro ler jornal no banheiro), acredito que tenha encontrado a resposta: as pessoas até querem os livros, até querem comprar móveis e imóveis, e até querem ver filmes. Mas o que elas sentem falta mesmo é de filas e multidões.
Se a internet, o VHS (e depois o DVD), os celulares, os notebooks e os home theaters a preços acessíveis criaram um mundo mais confortável, por outro lado eles também arquitetaram uma situação de profundo isolamento individual. Hoje, com o controle remoto do pay-per-view , um celular e um bom cardápio de pizza delivery ao alcance da mão, qualquer pessoa é totalmente auto-suficiente em seu lazer.
Porém, de forma individual.
Mas qual a graça de ver uma boa comédia totalmente sozinho? Na hora do susto do filme de terror, você vai agarrar o braço de quem? E quando dá aquela vontade incontrolável de fazer um comentário sobre o filme, aquele momento em que você descobre quem é o assassino e precisa falar, o que você faz? Manda um torpedo?
Não nos enganemos. O ser humano é um bicho que nasceu para andar em bando. É natural da vida. As bienais, os salões, as mostras e festivais comprovam que pessoas precisam ver pessoas, conversar com pessoas, respirar pessoas. E nem a melhor televisão de 800 polegadas com tecnologia LED HD e som basterofônico substitui um braço humano para ser agarrado na hora do susto.
O empresário brasileiro precisa compreender que Cinema é um ato social. É preciso construir mais salas de cinema. Salas maiores, com espaço para convivência e – por favor – fora dos shoppings, na rua, para todo mundo ver e ficar com vontade de entrar.
Sim, há mercado par isso, com certeza. Vejam por exemplo o sucesso de décadas do Espaço Unibanco de Cinema, na Rua Augusta (SP). Os filmes de lá são melhores do que em outros lugares? A projeção é melhor? O som é melhor? A tela é maior? Nada disso. Só que eles investiram num ponto fundamental: o saguão. Lá, o saguão é grande, tem um banco enorme para as pessoas se “encontrarem”, tem café, livraria, segurança, tudo o que é necessário para que as pessoas “convivam”. E o lugar acabou se transformando num ponto de encontro, mesmo para quem não vei verf o filme.
O Reserva Cultural, na Avenida Paulista, tem seguido o mesmo caminho.
Não é igual a muitos multiplexes por aí, projetados para que a “sala de espera” funcione igual aos corredores de um matadouro de bovinos, tudo armado para que a pessoa passe por ali o mais rápido possível, engula a sua pipoca, veja logo o filme e vá embora de uma vez.
Já está se formando a primeira geração de crianças e pré-adolescentes que estão se cansando do isolamento criado pela tecnologia virtual. É preciso conversar com nossos avós, para que eles nos contem sobre a alegria e a emoção de ir ao Cinema não apenas para ver o filme, mas sim para circular, para conversar, para trocar, para paquerar… enfim, pra viver.

