CONFIRA OS VENCEDORES DO FESTIVAL DE ROTERDÃ.
por João Moris, de Roterdã, para o Planeta Tela.
Terminou neste domingo (03/02) o Festival Internacional de Cinema de Roterdã (IFFR). O ganhador do prêmio máximo do júri (Tiger Award) foi o filme chinês da jovem diretora Shengze Zhu, Present. Perfect., um documentário sobre a indústria de videos online na China. Outro prêmio importante do júri é o Bright Future Award, que foi concedido à diretora japonesa naturalizada portuguesa, Aya Koretzky. Seu documentário A Volta ao Mundo Quando Tinhas 30 Anos é uma reconstituição das viagens que a diretora fez com o pai quando criança. Como não podia deixar de ser, o filme favorito do público do IFFR deste ano foi o drama libanês Capharnaum, da diretora Nadine Labaki, que já foi lançado no Brasil, concorre ao Oscar de melhor filme estrangeiro e está arrebatando as plateias por onde passa. Outro filme favorito do público do festival, que ganhou o prêmio Hubert Bals Fund Audience Award, é o improvável longa argentino La Flor, de Mariano Llinás, uma saga de quase 14 horas (!!) sobre quatro espiãs argentinas. O festival exibiu apenas a parte 2 deste filme neste ano, sendo que a parte 1 ganhou o mesmo prêmio no ano passado. Não assisti a nenhum destes filmes.
Entre os filmes de destaque que assisti na última semana do festival, todos abordam a questão de gênero. O longa mexicano Luciérnagas (Vagalumes, em tradução livre), da diretora iraniana naturalizada americana, Bani Khoshnoudi, é um tocante drama sobre um jovem gay iraniano que, ao ser banido do Irã, vai parar na cidade portuária mexicana de Veracruz dentro de um navio cargueiro. Ali, sem falar espanhol e sem entender a cultura local, ele irá experimentar muita solidão, machismo e desilusões, mas também solidariedade, carinho e entendimento.
Cena do filme mexicano Luciérnagas.
Outro filme que aborda o universo machista latino-americano, aqui com uma pegada bem mais crua e realista, é o longa argentino Hombres de Piel Dura, do diretor José Celestino Campusano, conhecido por seus filmes anárquicos, de baixo orçamento e polêmicos. Neste filme, ele trata com naturalidade a relação de um padre com um jovem adolescente de família abastada da zona rural, que passa a viver sua sexualidade com desenvoltura. As descobertas sexuais do adolescente trazem à tona um submundo onde nada é o que parece, principalmente as regras de comportamento que regem o universo masculino local.
Cena do argentino Hombres de Piel Dura.
A coprodução da Russia-Estonia, The Man Who Surprised Everyone, de Natasha Merkulova e Aleksey Chupov, é uma curiosa adaptação contemporânea de um antigo conto siberiano no qual um homem consegue enganar a morte incorporando uma mulher. Conta a história de um guarda florestal, casado com uma jovem grávida do segundo filho do casal, que se descobre com uma doença terminal. Após vários exames médicos e ao ser tratado por uma curandeira local, o homem entra em estado catatônico-vegetativo e passa a se vestir de mulher, para desespero de sua esposa e o horror da ultraconservadora comunidade local.
Cena da coprodução russa-estoniana The Man Who Surprised Everyone.
O cinema dinamarquês parece passar por um bom momento. Além do ótimo Culpa, lançado recentemente no Brasil, e Sons of Denmark, lançado no IFFR deste ano e comentado na minha primeira matéria desta cobertura, o festival exibiu o potente drama Queen of Hearts, da diretora May El-Toukhy, sobre uma bem-sucedida advogada, mãe de duas filhas e com um casamento aparentemente feliz, que (re)descobre sua sexualidade ao seduzir seu enteado adolescente, com quem mantém uma tórrida relação. O filme tem desdobramentos inesperados, sem nunca apelar para respostas fáceis. A destacar, a excelente atuação da grande atriz Trine Dyrholm, de Em um Mundo Melhor e A Comunidade.
A atriz Trine Dyrholm no filme dinamarquês Queens of Hearts.
O filme canadense Harpoon, de Rob Grant, é uma bem sacada comédia de humor negro pós-moderna, baseada no romance de Edgar Alan Poe, A Narrativa de Arthur Gordon Pym (1838). Três jovens amigos, dois homens e uma mulher, que estão sempre competindo entre si, ficam à deriva em alto mar na lancha de um deles. Ali, para além das disputas, algo muito mais sinistro ronda a amizade dos três, que culmina numa aposta para ver qual deles será devorado pelos outros dois. Além das cenas de canibalismo, o filme traz sangue e risada em profusão para nenhum aficionado do gênero botar defeito!
Cena da comédia de humor negro canadense Harpoon.
Por fim, um dos poucos filmes de diretor de renome que o IFFR deste ano exibiu foi Donbass, do celebrado cineasta ucraniano Sergey Loznitsa. O filme é um mosaico da Ucrânia contemporânea e mostra como a militarização do país e a degradação moral e ética da sociedade, em função de conflitos que eclodem em todos os cantos, afetam os cidadãos e as relações humanas em vários níveis. Por meio de pequenos registros ficcionais do cotidiano do leste ucraniano, o filme se torna um testemunho vivo das atrocidades e insanidades decorrentes do desgoverno e da incapacidade de imprimir rumo ao país.
Cena do filme ucraniano Donbass.
Aguarde a cobertura do Festival de Berlim (Berlinale), que vai do dia 7 a 17/2. Até breve!