É TUDO VERDADE: RESGATANDO “UM NOITE EM 67″.

por Celso Sabadin

Nem só de filmes inéditos vive esta 26a edição do Festival É Tudo Verdade. A partir de hoje (08/04), por exemplo, o evento disponibiliza on line e gratuitamente o excelente documentário “Uma Noite em 67″, dirigido a quatro mãos por Ricardo Calil e Renato Terra. Produzido pela Video Filmes, o filme relembra, em detalhes, a inesquecível final do Festival da Música Popular Brasileira de 1967, uma reunião histórica de alguns dos maiores nomes na nossa MPB.

Na época do lançamento do longa nos cinemas, conversei com seus diretores, num papo descontraído e divertido que reproduzo aqui:

PLANETA TELA – O filme me emocionou muito, pois me lembro com detalhes daquela histórica noite de 1967. Lembro-me inclusive que quando o cantor e compositor Sérgio Ricardo quebrou seu violão, antes de atirá-lo sobre a plateia, ele chamou o público e o Brasil de “subdesenvolvidos”. Ao vivo. A cena foi muito marcante, tanto que, durante um bom tempo após isso, Ronald Golias a reproduzia caricata e divertidamente no programa humorísitco “Família Trapo”, engolindo rapidamente as sílabas da palavra “subdesenvolvido”, que a ditadura da época não permitia.
A pergunta é: não sobrou nenhum pedaço de VT, de filme ou de gravação sonora, nada que contenha este momento específico do desabafo de Sérgio Ricardo? A ditadura da época foi eficiente o suficiente para não deixar nenhum vestígio para os dias de hoje?

RENATO E RICARDO – Ótima memória, Celso. Nas várias fitas do festival de 1967 que existem na Record (os filmetes acabaram originando diversas Betas), não encontramos o pedaço desse episódio – que foi relatado na autobiografia do Sérgio Ricardo e em alguns outros livros sobre o período. Se foi a ditadura? Não dá para afirmar. Mas há uma outra curiosidade que talvez alimente a tese: a apresentação do Geraldo Vandré nesse festival, com “Ventania”, é a única música que não encontramos nas fitas da Record, entre as 12 finalistas.

PLANETA TELA – Num momento em que existem vários documentários sobre personalidades do mercado musical, achei o recorte de enfocar uma única data, uma única noite, simplesmente genial. Como surgiu a ideia?

RENATO E RICARDO – Na ideia original (que o Renato Terra teve sete anos atrás), seria um filme sobre a grande era dos festivais (de 1965 a 1972, na definição do Zuza Homem de Mello). Logo ficou claro que seria amplo demais, com mais de uma dezena de festivais divididos entre Excelsior, Record e Festival Internacional da Canção. Pensamos em vários enfoques e chegamos à conclusão que deveríamos nos concentrar no festival que foi o mais rico musicalmente. A princípio, seria um filme sobre 67, mas que falaria um pouco do que veio antes e depois. Na montagem, decidimos nos concentrar só em 67. Depois, só na noite na final. E, depois, preferimos nos focar mais em seis músicas. A gente não queria fazer um catálogo sobre o evento, passar superficialmente pelas músicas e situações. Mas sim, de alguma forma, tentar passar a experiência daquela noite, usar as músicas na íntegra, aproveitar os bastidores, ter apenas depoimentos na primeira pessoa. Isso foi possível pelo recorte bem específico.

PLANETA TELA – Todas as cenas de arquivo exibidas no filme são as transmitidas pela Record. Não houve nenhum outro registro de imagens em movimento (inclusive coloridas) de algum cineasta amador, por exemplo, que a produção tivesse acesso? Ou isto não seria relevante ao documentário?

RENATO E RICARDO – Adoraríamos ter outros registros, mas não encontramos na pesquisa. Nas cenas de bastidores, você percebe um cinegrafista filmando os artistas com câmera na mão. Fomos atrás da trilha, mas ela deu em becos sem saída. Há uma única cena de arquivo que não é da Record: as imagens da passeata contra a guitarra elétrica, que conseguimos na Cinemateca Brasileira – e que nós jamais havíamos visto.

PLANETA TELA – O fato do filme ser co-produzido pela Record gerou algum tipo de orientação específica do Grupo, como algum assunto a ser evitado, algum nome a ser esquecido ou coisa parecida? (Desculpe por favor se a pergunta parece um pouco inadequada, mas todos conhecemos as bases e origens da Igreja Universal).

RENATO E RICARDO – Não houve orientações específicas, ou mesmo gerais, da Record. Nós tivemos absoluta liberdade para fazer o filme que queríamos.

PLANETA TELA – Existem novos projetos de vocês para a realização de outros documentários no estilo?

RENATO E RICARDO – Por enquanto, só existe o desejo de continuar realizando documentários, e conversas muito incipientes entre nós dois sobre algumas ideias. Há também a vontade de aproveitar de alguma forma o enorme material que colhemos e deixamos de fora por conta do enfoque específico. Mas já posso adiantar que o DVD de “Uma Noite em 67″ terá extras maravilhosos.

Saiba tudo sobre o 26o. É Tudo Verdade em http://etudoverdade.com.br/br/home/