FESTIVAL CINEMA NA FRONTEIRA: ONDE ESTA GURIZADA PENSA QUE VAI?

Assisti ontem, aqui no 5º Festival Internacional Cinema da Fronteira, a uma sessão de onze curtas metragens que durou duas horas e meia. Todas as produções exibidas são universitárias, criadas, produzidas e dirigidas por estudantes de audiovisual de várias universidades pelo país. Na sessão de ontem, a maioria era de escolas gaúchas.

E a gurizada se expressou das mais diferentes maneiras, cada um com seu estilo. Um belo trabalho mostrava a personificação da culpa de dois amigos que participaram de um trote violento e fatal contra uma caloura da universidade. Outro utilizou o recurso da câmera subjetiva para retratar o desespero de um viciado em crack. Um terceiro documentou a aflição de portadores de HIV. Havia animações, dramas, um simpático romance estilo “Medianeras”, um filme excessivamente verbal, outros aqui e ali talvez excessivamente longos, boas ideias, belas imagens, câmeras firmes, trilhas elaboradas, algumas interpretações marcantes.

Enfim, ao cabo de duas horas e meia achatando a bunda na cadeira de madeira da sala de exibição, saio da sessão com uma certeza: “Habemus Cinema”. Sim, habemus toda uma novíssima geração que sabe montar uma luz, posicionar uma câmera, mixar um áudio, dirigir um ator ou um colega, expressar suas ideias com maiores ou menores índices de imprecisão. Apesar de ser crítico de cinema, não estava naquela sessão para procurar defeitos ou pelos em ovos: sabia que eram filmes universitários e, portanto, passíveis dos mais diversos erros. Afinal, se até nossos consagrados cineastas têm errado feio, o que não dizer de jovens iniciantes? Não era esta a intenção; não buscava por nenhuma obra prima que fosse revolucionar a história do cinema. Por isso saí feliz, sabendo que a fila do cinema brasileiro tem tudo para andar, para revelar novos talentos e trazer frescor às nossas telas.

Porém, e sempre tem um porém, uma pergunta me veio à mente: onde esta gurizada pensa que vai? Me preocupo com a possibilidade desta piazada cheia de energia, cheia de gás, e que nasceu na era digital, acostumada a ver o resultado de seu trabalho com o imediatismo das novas mídias, bater com a cara no muro da atual estrutura paleozoica do cinema brasileiro. Uma estrutura amarrada por entraves burocráticos que exigem que a criatividade do cinema seja engessada em planilhas e canalizada em corredores de repartições públicas. Uma estrutura dominada por distribuidoras, em sua maioria toscas, que lançam filmes no mercado com a mesma criatividade que lançam balas Juquinha.
Uma estrutura formada por salas de cinema que têm na venda de pipoca sua única preocupação real.

Esta garotada que tem inventado novas formas de fazer imagens e sons muito em breve vai perceber que pegar a Cannon 5D e produzir um belo longa em 15 dias está cada vez mais fácil. E que o difícil mesmo é enfrentar uma Ancine com sua burocracia da era colonial, uma distribuidora que não aceita que seu filme não seja uma comédia com atores da Globo, e um exibidor que acha que Truffaut é uma espécie de chocolate.

Por isso, gurizada, a ideia é a seguinte: fazer filmes? Sim, claro, sempre, cada vez mais e cada vez melhores. Mas vamos também criar novas fórmulas para fazer com que eles cheguem ao público sem passar pelos filtros viciados destes esquemas mastodônticos que só privilegiam os que já são privilegiados. Vamos botar a cabeça para funcionar e fazer com que, a mesma revolução que está acontecendo com as formas digitais de produção, aconteça também nas formas de fazer com que os novos produtos audiovisuais cheguem ao novo público.

Tenho certeza que existem milhões de brasileiros que não aguentam mais uma novela, não engolem mais um Datena, não acreditam mais em nenhum telejornal e também não se sujeitam mais a perder dinheiro com vendedores de pipoca que dizem ser sala de cinema. Se for criada alguma possibilidade para que estes brasileiros, de alguma forma, tenham contato com o que eu vi na sessão de ontem aqui no Festival da Fronteira, sem a intermediação de empresas que pensam que filme e sabão em pó é a mesma coisa, aí sim poderemos responder com otimismo à pergunta-título desta matéria.

Aí sim esta gurizada vai longe.