FESTIVAL DE PAULÍNIA AJUDA A PRODUZIR. MAS QUEM EXIBE?

Durante a cerimônia de abertura do 3º Paulínia Festival de Cinema, ontem (15) à noite, na cidade homônima, foi exibido um belo vídeo institucional sobre o Pólo de Cinema aqui do município. Como se dizia antigamente, “coisa de cinema”. Belos estúdios, vários projetos, infraestrutura invejável, e um compreensível tom ufanístico. No final do material, o pomposo locutor (se não me falham os ouvidos, o veterano Walker Blaz) anuncia: “Pólo de Cinema de Paulínia – Breve, num cinema perto de você”.

É aí que o bicho pega: QUE cinema perto de você, cara pálida? O cinema brasileiro, que entre trancos e barrancos vem conseguindo resolver seu outrora crônico problema de produção (também graças a Paulínia), não consegue resolver seus gigantescos problemas de distribuição e exibição. Ou talvez não queira. O Brasil conta com irrisórias 2.200 salas de cinema, distribuídas entre apenas 8% dos nossos municípios. O que equivale a dizer que 92% de todos os municípios brasileiros não possuem sequer uma única sala de cinema. Ou seja, para a grande maioria dos brasileiros, não existe o tal “cinema perto de você”. Existe só o Pirata bem pertinho.

Homenageado na noite de ontem, o cineasta Hector Babenco (foto) exemplificou o problema em números: “Conversando com o prefeito de Paulínia, fiquei sabendo que a cidade tem 80 mil habitantes e este é o único cinema daqui. Quando eu era jovem, minha cidade tinha 140 mil habitantes e 14 salas de exibição”.
Como criar uma cultura cinematográfica desta maneira? Produzindo sem exibir? Alguém consegue imaginar a Fiat feliz da vida por produzir milhares de automóveis e os deixando enferrujar nos pátios?

Mas voltemos à abertura do Festival: estranhamente simpático e comunicativo, Hector Babenco foi homenageado na noite de abertura do evento, onde foi exibida uma cópia nova de “O Beijo da Mulher Aranha”, que completa 25 anos. Bem humorado, afirmou que faz cinema por não saber fazer outra coisa na vida. “Houve um momento em que cheguei a ter três relógios despertadores por não conseguir trocar as pilhas deles”, disse. E se mostrou positivamente espantado pela leveza e pela rapidez com que os filmes são feitos atualmente no Brasil, relembrando as dificuldades técnicas que teve para realizar seu “O Beijo…”.

Na excelente projeção do Theatro (assim mesmo, com “th”) Municipal de Paulínia, “O Beijo da Mulher Aranha” provou que resiste no tempo. Mesmo após um quarto de século, a obra de Babenco continua vigorosa e emocionante. Confesso que até bem pouco tempo atrás, achava que o filme fosse uma coprodução entre Brasil e EUA. Foi seu produtor, Francisco Ramalho Jr., quem me relatou a história toda, e me informou se tratar de um filme 100% brasileiro. Trata-se então, oficialmente, o primeiro prêmio Oscar recebido por uma produção nacional, já que na época William Hurt levou a estatueta de ator. Mais informações podem ser lidas no livro “Éramos Apenas Paulistas – A Biografia de Francisco Ramalho Jr.”, editado pela Imprensa Oficial.

Feito o merchandising, vale dizer que Paulínia começa com a expectativa de só apresentar filmes inéditos em sua programação competitiva, transformando-se numa generosa vitrine do cinema brasileiro. Afinal, este é o único Festival do país que não só mostra e premia filmes, como também os produz.

Resta agora ao empresariado brasileiro investir em mais, muito mais, em salas de cinema, para atingir a imensa parcela da população que só vê filmes na TV ou no DVD.

Celso Sabadin viajou a Paulínia a convite dos organizadores do evento.