HISTÉRICO, “O BEM AMADO” ABRE O FESTIVAL CINE PE 2010.

Haja ouvidos! É preciso ter uma boa dose de complacência auditiva para acompanhar, do começo ao fim, a comédia “O Bem Amado”, novo filme do diretor Guel Arraes, baseado no antigo sucesso da TV estrelado por Paulo Gracindo, que por sua vez foi baseado na peça de Dias Gomes.

Fora da competição, o filme abriu na noite de ontem (26) a 14ª. Edição do Cine PE.

Agora, o papel título, que era de Gracindo, é de Marco Nanini. E Zeca Diabo (antigamente, Lima Duarte) é José Wilker. A trama fala do corrupto prefeito da fictícia Sicupira que desvia as verbas do município para viabilizar sua obra “faraônica”: a construção de um cemitério local. O campo santo é concretizado, mas para deleite da oposição, ninguém morre na cidadezinha, tornando a obra um elefante branco. Odorico Paraguaçu, o “Bem Amado”, precisa urgentemente resolver esta situação.

O texto original de Dias Gomes – maravilhoso – poderia render um excelente filme, se bem adaptado para as telas. Porém, Guel Arraes (diretor também de “O Auto da Compadecida”), optou por transformá-lo numa espécie de “Zorra Total” em longa metragem. Os personagens berram o tempo todo (gritar é pouco), o histrionismo corre solto, o ritmo é frenético (embora tudo se passe numa cidadezinha onde teoricamente nada acontece), tudo é exagerado, coloridíssimo, barulhentíssimo, histérico.

Há momentos de “O Bem Amado” em que os fatos se desenrolam em ritmo tão alucinado que a sensação é de estarmos assistindo a um trailer. Um gigantesco trailer de 107 minutos, onde não há tempo para respiro ou reflexão. É como se um montador de cenas de ação de Hollywood tivesse sido contratado para editar a sutileza cômica e política de Dias Gomes. Algo assim como um elefante em loja de cristais.

Compreende-se, porém, a intenção de Guel Arraes, homenageado na noite de ontem no Cine PE. Em algum momento da história do cinema, alguém começou a vender a idéia de que quanto mais alucinógena for a edição de um filme, quanto menos o público tiver a oportunidade de respirar, mais comercial será este mesmo filme. Ou “produto”, como querem alguns. Em algum momento alguém começou a vender a idéia de que, em Cinema, pensar é o mesmo que se aborrecer. E o estilo histérico-televisivo-sufocante começou também a contaminar a tela grande.

Guel, como diretor Global, visa o sucesso. E a Globo Filmes, como empresa comercial, idem. Nada contra ganhar dinheiro. Mas se “O Bem Amado” vier a provar, em sua estréia no circuito, que o sucesso comercial passa necessariamente pela histeria narrativa, terei de ir correndo até a farmácia mais próxima para comprar algodão para os ouvidos (como, aliás, faz o personagem de Matheus Nachtergaele).
Como disse um anônimo na noite de ontem, aqui em Recife, “este deve ser o tal cinema de inclusão dos deficientes auditivos, que tanto falam”…