ITAÚ “MORDE E ASSOPRA” EM SUA POLÍTICA CULTURAL.

Por Celso Sabadin.

Após anunciar, em setembro do ano passado, o fechamento de 17 salas de cinema em Salvador, Curitiba e Porto Alegre (felizmente a situação do Cine Glauber Rocha, na capital baiana, foi contornada), e após confirmar a triste notícia da demolição do tradicionalissimo Anexo do Espaço Itaú,  em São Paulo, para entrega do prédio, o Itaú anuncia agora uma bem-vinda pareceria com a Cinemateca Brasileira.

Fica um pouco difícil compreender qual é exatamente a política cultural do Grupo Itaú Unibanco, que lucrou R$ 7,1 bilhões no 4º trimestre de 2021, em plena pandemia, o que representa uma impressionante alta de 32,9% em relação ao mesmo período do ano anterior . Se, com uma mão,  o grupo retira o patrocínio e inviabiliza espaços presenciais dos mais importantes da cultura cinematográfica brasileira, com a outra, ele investe no streaming.

Mesmo sem compreender exatamente a estratégia, vamos à boa notícia: 

Na última sexta-feira deste mês, 29 de abril, a plataforma de streaming de cinema brasileiro Itaú Cultural Play – itauculturalplay.com.br – amplia as suas parcerias com a recém firmada com a Cinemateca Brasileira, em São Paulo. A exibição de 13 filmes – vindos desta fundamental memória do cinema do país, que contém mais de 40 mil títulos e um vasto acervo documental que abarca 120 anos da produção nacional –, se divide em duas mostras de obras preservadas pela instituição.

O cinema sempre foi colorido traz seis produções dos tempos do cinema mudo brasileiro, colorizadas por técnicas como pintura à mão, estêncil, tingimento e viragem. Veja o Brasil apresenta sete filmes curtos realizados pelo pesquisador Alceu Maynard de Araújo para a extinta TV Tupi, nos anos de 1950.

 

“Esta nossa parceria com a Cinemateca celebra o mais importante patrimônio cinematográfico brasileiro”, diz Eduardo Saron, diretor do Itaú Cultural. “Não há o novo e novas fronteiras sem a memória. Ela nos dá repertório e referência para avançarmos. Portanto preservar a cultura e seu legado é garantir o futuro identitário e diverso que desejamos”, conclui.

 

“Um dos objetivos primordiais da Cinemateca Brasileira é a preservação da memória audiovisual brasileira e a parceria com o Itaú Cultural abre espaço para que o público conheça filmes do seu acervo, incluindo conteúdos inéditos restaurados pela instituição”, diz a diretora da Cinemateca Brasileira, Maria Dora Genis Mourão.

 

Maior acervo de filmes da América do Sul e membro pioneiro da Federação Internacional de Arquivo de Filmes – FIAF, a Cinemateca tem sua origem em 1946 com o segundo Clube de Cinema de São Paulo; passando em 1949 à Filmoteca do Museu de Arte Moderna de São Paulo, e em 1956 torna-se Cinemateca Brasileira. Foi idealizada pelo seu conservador-chefe e diretor Paulo Emílio Sales Gomes – para quem o site do Itaú Cultural presta homenagem, publicando, também em 29 de abril, texto sobre ele, assinado por Carlos Augusto Calil, presidente do Conselho de Administração da Cinemateca.

 

Hoje, o acervo desta instituição soma mais de 40 mil títulos e um vasto acervo documental (textuais, fotográficos e iconográficos) sobre a produção, difusão, exibição, crítica e preservação cinematográfica, além de um patrimônio informacional online dos 120 anos da produção nacional.

 

As mostras

Para a maioria do público contemporâneo, filmes silenciosos são preto-e-branco. Porém, desde 1895, muitos deles já eram colorizados por técnicas diversas, como se vê na mostra O cinema sempre foi colorido. Ela oferece títulos em uma mescla do charme do cinema silencioso e o encanto da cor, sob a direção de importantes pioneiros da filmografia brasileira.

 

No total, este recorte traz seis títulos, como Braza Dormida, drama, realizado em 1928 por Humberto Mauro e marco do cinema silencioso brasileiro, restaurado pela Cinemateca. O filme se destaca pela sobriedade de sua construção dramática, pelos cenários e pela direção de atores, qualidades que fazem do diretor mineiro um dos maiores criadores cinematográficos de sua época. Nele, um malandro carioca é contratado como gerente de uma usina para substituir um funcionário da fazenda, que não aceita a demissão. Ao conhecer a filha do industrial, o carioca se apaixona por ela, mas o demitido faz tudo para impedir que se consuma um relacionamento entre os dois.

 

Outro destaque nesta mostra, também restaurado pelo Cinemateca, é Veneza Americana, de Ugo Falangola e J. Cambiéri. Eles entraram para história do cinema nacional ao fundarem uma das primeiras companhias produtoras do estado de Pernambuco. A dupla dirigiu este filme de beleza plástica em seus letreiros e imagens colorizadas, em 1925. Trata-se de um documentário, onde o porto do Recife e suas obras de reparação nos anos 1920 são a principal inspiração, ao lado do elogio aos figurões da política local na época, como o governador Sérgio Loreto. A modernidade da chamada Veneza americana é também captada por meio do registro de construções viárias e automóveis.
Mais quatro produções do gênero completam esta mostra: Exemplo Regenerador,
comédia de sete minutos realizada por José Medina em 1919; Brasil pitoresco: as viagens de Cornelio Pires, sob a direção do próprio viajante, em 1925; Ouro Fino, documentário de Bruno Guidi, de 1926; Companhia Docas de Santos, mais um documentário, realizado em 1928 e cuja direção não foi identificada.

 

Por sua vez, Veja o Brasil, traz filmes do programa de Restauro Cinemateca Brasileira – Petrobras, edição 2007. O recorte é de produções realizadas pelo pesquisador Alceu Maynard de Araújo para a extinta TV Tupi. Foram produzidos na década de 1950 com a preocupação de retratar e preservar muitas das tradições populares brasileiras, além de conformar um retrato de época do ponto de vista econômico e social.

 

Os filmes contemplam diferentes aspectos da sociedade brasileira da época e resgatam elementos da vida material, social e comportamental dos brasileiros. São todos sonoros e de curta duração, entre 3 e 10 minutos. São eles: Petróleo, Sondas e Refinarias, Manaus – Rubens Ferreira, Arte Popular, Bahia de Dona Janaína, Casa de Farinha, Noite de São João e Crepúsculo de Tupã

 

Novidade do ETV

Também no dia 29, sobe na Itaú Cultural Play mais uma série de curtas-metragens vencedores do Festival É Tudo Verdade, entre 2011 e 2020. São seis: A poeira e o vento, realizado por Marcos Pimentel, e Ser tão cinzento, de Henrique Dantas, os dois de 2011; Borscht, uma receita russa, de Marina Quintanilha e Pátio, de Aly Muritiba, ambos realizados em 2013; Cordilheira de Amora II, de Jamille Fortunato, de 2015; Abissal, dirigido por Arthur Leite em 2016, Boca de fogo de Luciano Pérez Fernández, de 2017, assim como Nome de Batismo – Alice, de Tila Chitunda.

 

SERVIÇO: 

Itaú Cultural Play

29 de abril de 2022

Parceria com a Cinemateca Brasileira

Em itauculturalplay.com.br

 

Mostra: O cinema sempre foi colorido

Exemplo Regenerador, de José Medina (1919) – na foto desta matéria.

Brasil pitoresco: as viagens de Cornelio Pires, de Cornélio Pires (1925)

Veneza Americana, de Ugo Falangola e J. Cambiéri (1925)

Ouro Fino, de Bruno Guidi (1926)

Companhia Docas de Santos, diretor não foi identificado (1928)

Braza Dormida, de Humberto Mauro (1928)

 

Mostra: Veja o Brasil

Todos dirigidos por Alceu Maynard Araújo, nos anos de 1950

Petróleo, Sondas e Refinarias

Manaus – Rubens Ferreira

Arte Popular
Bahia de Dona Janaína
Casa de Farinha
Noite de São João
Crepúsculo de Tupã

 

Curtas premiados no Festival É Tudo Verdade (2011 a 2020)

A poeira e o vento, de Marcos Pimentel (2011)
Ser tão cinzento, de Henrique Dantas (2011)

Pátio, de Aly Muritiba (2013)
Borscht, uma receita russa, de Marina Quintanilha (2013)

Cordilheira de Amora II, de Jamille Fortunato (2015)
Abissal, de Arthur Leite (2016)
Boca de fogo, de Luciano Pérez Fernández (2017)
Nome de Batismo – Alice, de Tila Chitunda (2017)