QUARTA-FEIRA DE LUTAS PELA LIBERDADE EM GRAMADO.

Celso Sabadin, de Gramado.

Tanto na mostra competitiva latina como na brasileira o grande tema dos longas de ontem (12/08) foi a eterna e ininterrupta busca pela liberdade. Da Costa Rica veio o surpreendente “Presos”, filme selecionado para o Festival de Málaga, na Espanha, escrito e dirigido por Esteban Ramirez, cineasta premiado em importantes festivais como Huelva e Trieste.

Toda a trama é conduzida por Vitória (Natalia Arias, ótima), uma jovem cheia de energia e força de vontade que depois de muita luta consegue um emprego numa seguradora. Através de seu patrão, ela conhece o presidiário Jason (Leynar Gomez), com quem começa a manter contatos telefônicos. Nasce assim um relacionamento que atrairá medos, preconceitos, e fará com que a garota questione os limites de sua própria liberdade.

O filme foi inspirado num documentário realizado pelo pai do cineasta, nos anos 70, que investigava a realidade carcerária costarriquenha. Com o formato ficcional, “Presos” se mostra vigoroso, dirigido com muita segurança por um cineasta que consegue extrair ótimas interpretações de seu elenco. O bom roteiro também acerta ao não se apoiar em maniqueísmos fáceis e ao surpreender em busca de soluções verossímeis para os destinos dos seus muito bem construídos personagens.

Chama ainda a atenção o fato de que – diferente do que muitas vezes acontece em outros países latino-americanos – “Presos” ser uma produção totalmente nacional costarriquenha, sem mecanismos de coproduções com mercados de cinematografia mais tradicional.

Uma ótima surpresa.

O Outro Lado do Paraíso

Na segunda parte da sessão de ontem foi exibido o longa brasileiro “O Outro Lado do Paraíso”, com direção de André Ristum, o mesmo do ótimo “Meu País”. E novamente aqui o tema foi a busca pela liberdade. Não exatamente as liberdades pessoais e individuais narradas em “Presos”, mas a liberdade de todo um país. O nosso.

Com uma ótima direção de arte e reconstituição de época raramente vista em nosso cinema, o filme começa mostrando uma família simples no interior de Minas Gerais, no início dos anos 60. O pai (Eduardo Moscovis), um eterno sonhador, não se cansa de procurar uma vida melhor para sua esposa e três filhos, até que um dia esta esperança se materializa na mítica recém-fundada nova capital do país: a bordo de um velho caminhão, todos seguem para Brasília, a terra prometida.

Porém, aproxima-se o golpe de 1964, e todos os sonhos terão de ser interrompidos. Ou, pelo menos, adiados.

“O Outro Lado do Paraíso” é baseado no livro homônimo e autobiográfico de Luiz Fernando Emediato, que também tornou-se produtor do filme. É ele o personagem Nando (Davi Galdeano, muito bom), o garoto que conduz toda a trama e que terá de aprender precocemente o peso e a dor das separações e privações.

Dado o momento político que estamos, onde parte da população simpatiza com o horror vivido no Brasil pós-64, “O Outro Lado do Paraíso” pode ser considerado obrigatório: já que muitos não tiveram aula de História na escola, nunca é tarde para tê-las agora no cinema. Todo o esclarecimento sobre aquele período é bem-vindo, principalmente neste caso, um filme que exibe uma dramaturgia bem desenvolvida, permeada pelas mais sensíveis emoções humanas, e com uma narrativa que tem todos os elementos necessários para agradar o grande público.

Cinematograficamente falando – e volto aqui a bater na mesma tecla de muitas críticas anteriores – o filme ganharia muito mais em dimensão, emoção e arte se eliminasse sua narração em off, praticamente toda ela redundante e desnecessária. Dizem, e eu concordo, que o crítico deve analisar o filme feito, e não o que ele gostaria de ter visto, mas neste caso é impossível ficar alheio à narração, que enfraquece as belas imagens e a sólida dramaturgia cada vez que entra em cena.

Fica a sugestão.

 Celso Sabadin viajou a Gramado a convite da organização do festival.