REPENSANDO GRAMADO: A QUEM DEVE SERVIR UM FESTIVAL DE CINEMA?

37o. Festival de Cinema de Gramado. A cidade é linda, o clima é de festa, o chocolate quente é ótimo, mas um bate papo entre dois rapazes que trabalham na recepção do hotel em que estou hospedado me chamou muito a atenção. Ao verificar um site contendo informações sobre o evento, um dos rapazes disse ao colega: “Imagina! Pagar 50 reais por um ingresso para o Festival”. Ao que o outro retrucou: “Mas é 50 reais para a semana toda do Festival, né?”. Não, não é. São 50 reais por noite! E o preço parece que dobra na premiação de sábado.

Fiquei pensativo: afinal, a quem serve um Festival de Cinema? Quando uma cidade organiza um evento cultural deste porte não deveria haver algum tipo de, digamos, contrapartida social? Ou, em outras palavras, e o povo da cidade de Gramado, como fica? Tudo bem que há sessões gratuitas espalhadas por outros cantos da cidade, mas não seria muito mais interessante integrar essa população com o “coração” do evento propriamente dito, ao invés de “espantá-la”, de forma elitista, para sessões distantes através de preços exorbitantes?

Acredito que um dos principais motivos da existência de um Festival de cinema (talvez o mais importante) é o de formar público. Cativar o habitante da cidade onde o evento se realiza, exibir filmes brasileiros em cidades em que não existam salas de cinema, criar cultura cinematográfica, difundir nossa produção junto ao público em geral, enfim, dar acesso cinematográfico à população. Mas que acesso é possível dar cobrando 50 reais um ingresso?

Um Festival deveria ser, antes de mais nada, um grande congraçamento popular, como acontece, por sinal, no Festival de Recife, que cobra o ingresso baratinho e faz uma plateia superior a 2 mil pessoas por noite.
Fico inclusive pensando na minha própria função de jornalista. Estou aqui como convidado do Festival, e a minha “contrapartida profissional” é divulgar o evento nos meios de comunicação que eu trabalho, para que mais e mais pessoas fiquem sabendo de sua existência. Parece justo. Mas do que adiante eu difundir o Festival para a população, se um simples ingresso para uma simples noite custa 50 reais? Com quem eu estou falando? Para quem eu estou comunicando tudo isso? Para o próprio mercado cinematográfico? Para algumas centenas de pessoas que deveriam ver os filmes, à noite, mas que preferem (várias delas) ficar “fazendo social” no saguão?

Parece pouco. Muito pouco para um evento de porte, pompa e circunstância como este 37o. Festival de Cinema de Gramado. O brasileiro gosta de se ver na tela, gosta de ver o cinema do seu próprio país, e todo o evento desta área – independente de porte – deveria privilegiar este contato do público brasileiro com a sua expressão cinematográfica.

Principalmente num país onde apenas 8% dos municípios possuem sala de cinema. Num ano atípico, em que as verbas dos patrocinadores encolheram ainda mais por causa da tal crise mundial, fica aí o tema para reflexão…