TIRADENTES 2015: “O TEMPO NÃO EXISTE NO LUGAR EM QUE ESTAMOS” DIZ UM POUCO DE CADA UM DE NÓS.

por Celso Sabadin, de Tiradentes.

Costumo conversar com meus colegas dizendo que, a exemplo dos ascensoristas e consertadores de máquina de escrever, o crítico de cinema exerce hoje uma profissão em extinção. Entendendo-se como profissão algo pelo qual se remunera. Todo mundo acha o crítico de cinema uma figura “legal” e “interessante”, mas quase ninguém quer pagar pelos seus serviços.

Neste sentido, me senti profundamente identificado e representado pela produção mineira “O Tempo Não Existe no Lugar em Que Estamos”, exibido ontem (26/01) aqui na Mostra de Tiradentes.

O filme fala de Aldo (André Gatti, professor de cinema que manda bem como ator), um fotógrafo sessentão que revê sua vida enquanto desmonta o quartinho em sua casa onde guardava seus arquivos e equipamentos fotográficos. Como disse o diretor Dellani Lima na apresentação deste seu nono longa metragem, “é um filme simples”. De fato. Mas é desta simplicidade que “O Tempo Não Existe no Lugar em Que Estamos” extrai toda a sua carga emotiva.

Através de uma entrevista que Aldo dá para uma equipe de filmagem (um documentário, uma reportagem, talvez? Não importa) ficamos sabendo que o personagem começou com a cara e com a coragem, foi autodidata, cresceu na profissão, destacou-se, não se atualizou com a tecnologia digital, foi dar aulas numa época em que o diploma não era necessário, foi ultrapassado, e hoje passa por apertos. Ou seja, uma trajetória idêntica à de milhares de profissionais, de sua área ou não. É tocante a cena onde ele pede emprego a um ex-aluno que o chama de “mestre”, mas nada pode fazer. Plano único, fechado, sufocante, impactante.

Ironicamente, ele mora numa casa cercada por prédios igualmente sufocantes, rodeada por janelas enfileiradas que lembram as antigas fitas de negativos fotográficos que provavelmente boa parte dos presentes na sessão de ontem sequer conheciam antes de ver o filme. Uma casa que, a exemplo do personagem, deve ter conhecido melhores horizontes em épocas passadas.

Aldo é assombrado e perseguido pelo seu passado, representado no filme por ele mesmo, enquanto jovem. Seu maior ponto de apoio, de equilíbrio, são as fotos que tirou, a obra que produziu, sua memória. Aliás, no sentido mais literal da palavra memória, conforme o filme mostrará.

Contudo, ao contrário do que possa parecer, “O Tempo Não Existe no Lugar em Que Estamos” não é um filme depressivo. O quartinho de Aldo abrirá espaço para um renascimento, para uma nova vida, uma continuidade, não se discute se melhor ou pior, mas uma continuidade, um novo tempo sem tempo para o analógico, uma prova do inexorável futuro que acontece sem a nossa permissão nem o nosso controle. Sem juízo de valor. Apenas acontece.

Celso Sabadin viajou a Tiradentes a convite da organização do evento.