VALE-CULTURA PODE TRAZER RESULTADOS POSITIVOS PARA O NOSSO CINEMA.

Finalmente, autoridades governamentais criaram um instrumento visando menos a produção cultural (algo que tem sido frequente há mais de duas décadas) e mais o público, o acesso a essa produção. Na área do cinema, por exemplo, o que temos visto é um gradativo afastamento de nossos filmes da preocupação em ter comunicação com as camadas de menor poder aquisitivo. Claro, se houve queda no faturamento dos lançamentos cinematográficos, isso se deve também a outros fatores. Como o alto preço do ingresso e as despesas geradas por uma ida a uma sala de shopping, onde se concentram os cinemas. Os exibidores insistem em cobrar cerca de R$ 8 ou R$ 9 (o preço médio no Brasil, segundo estatística oficial), mas desconsideram que, quase sempre, existem as despesas de estacionamento nas grandes cidades e de pipoca (caríssima). E o espectador ainda é coagido a assistir cinco a dez minutos de comerciais, que garantem um bom faturamento aos donos das salas. Ou seja, estes nunca perdem, ou deixam de ganhar, ao contrário do realizador do filme. Essa situação vem de longe e foi a que originou, por volta de 1967, o cumprimento rigoroso da reserva de mercado para o filme nacional. Caso não existisse essa cota de tela, o filme brasileiro (então feito sem subsídios) ficava na fila de “Rambo”, “Rambo II”, etc. A produção americana tinha preferência, chegava antes ao Brasil do que o longa nacional. Aliás, ainda chega.

Mas, sem generalizar, é preciso reconhecer que nosso mecenato oficial criou cineastas acomodados em orçamentos generosos, excessivos, incompatíveis com o mecanismo de retorno de nosso mercado, a renda média bruta capaz de, pelo menos, amortizar os custos. Basta ver o quadro de longas lançados em 2009. Só três, em meio de uns 30, ultrapassaram um milhão de espectadores. Há casos de filmes que, oficialmente, custaram oito milhões de reais e mal faturaram quatro brutos. Um desperdício de boa parte da grana saída da renúncia fiscal. Ou seja, impostos que deixaram de existir e que poderiam suprir as deficiências da saúde pública, da segurança, etc. Nesse sentido, o inacabado “Chatô”, que Guilherme Fontes começou a dirigir em 1999, é o exemplo mais emblemático. Daí a citada ausência de diálogo com o público e a insistência de alguns (também no teatro) de tentarem impor ao vale-cultura um certo dirigismo, uma seleção oficial. Ou seja, tirar o livre arbítrio na escolha dos futuros beneficiados pela nova conquista. Querem que esse vale não seja usado em comédias como “Se eu Fosse Você 2”, mas em filmes-cabeça ou de pouca clareza (na luz e na comunicação) como o recente “A Festa da Menina Morta”.

O vale-cultura dificilmente vai acabar com certos desperdícios, mas certamente irá gerar mais idas aos cinemas, teatros, mais aquisições de livros, CDs e DVDs. Estes ainda estão caros, especialmente para os donos das locadoras que, além do custo, enfrentam a concorrência desleal da pirataria e do download. Mas essa já é uma outra questão, que exige maior abordagem.