“CONTRATEMPOS”, O HORROR NOSSO DE CADA DIA.

Por Celso Sabadin.

Muitas vezes, para causar ansiedade e taquicardia nas plateias, nada mais eficiente que retratar apenas e simplesmente a desesperada correria de um dia comum. É o que faz o drama francês “Contratempos”, em cartaz no Brasil desde a última quinta-feira. 10/11.

Mãe de um casal de filhos pequenos, Julie (Laure Calamy, de “Minhas Férias com Patrick”) precisa acordar e deixar suas crianças para a vizinha tomar conta antes mesmo do sol nascer, para depois pegar o trem que a levará até um luxuoso hotel parisiense, onde comandará um time de camareiras que farão o possível e o impossível para satisfazer os mais exigentes hóspedes. Como transtorno pouco é bobagem, a rede de transportes públicos da capital francesa está em greve, e Julie ainda terá de driblar sua chefe para tentar comparecer a uma entrevista de emprego que poderá mudar sua vida.

Com roteiro e direção de Eric Gravel, “Contratempos” escancara como a simples rotina contemporânea de uma sociedade sufocada pelo capitalismo exploratório pode ser mais angustiante que um filme de terror. Até porque – diferente dos filmes de terror – tal contemporaneidade é real.

Um dos grandes méritos do longa é a construção de seus personagens, que passam longe das estereotipificações simplificadoras de bem/mal, chefe/empregado, colocando-os num mesmo patamar humano e não maniqueísta de vítimas de um sistema que comprovadamente não funciona mais. Se é que um dia funcionou.

“Contratempos” venceu os prêmios de Melhor Direção e Melhor Atriz na Mostra Horizontes do Festival de Veneza 2021.