“TÁ CHOVENDO HAMBÚRGUER” É UMA DAS MELHORES ANIMAÇÕES DA TEMPORADA.

Alguém (não sei quem) disse (não sei quando) que só existem uns 30 e poucos (não sei exatamente quantos) roteiros básicos na História do Cinema.

Bom, eliminando a extrema precisão desta afirmação (e minha prodigiosa memória), a ideia é a seguinte: segundo este estudioso, que não me lembro quem é, existem menos de 40 situações dramáticas exploradas pelo Cinema. E que todos os milhares de longas metragens feitos até hoje, em toda a História, seriam somente adaptações e desdobramentos destas mesmas situações básicas.

Não sei se a teoria é verdadeira, mas esta ideia me voltou à mente ao ver “Tá Chovendo Hambúrguer”. É impressionante como as histórias infantis em geral e os desenhos animados em longa-metragem em particular têm explorado o tema básico do Patinho Feio. Se pegarmos alguns exemplos aleatórios – digamos – “Vida de Inseto”, “Rattatouille”, “Dumbo”, “Formiguinhaz”, “O Galinho Chiken Little”, “Monstros S/A” e agora “Tá Chovendo Hambúrguer”, é possível ver como todos eles – e muitos mais que não me ocorrem no momento – partem da mesma premissa: o protagonista que parece totalmente desprovido de talento, é ridicularizado e segregado no meio social onde vive por ser “diferente”, marginaliza-se, para que depois uma força maior revele que ele tem, sim, um dom especial, uma particularidade que o transformará em heroi tanto dentro de seu convívio social como fora dele.

A fórmula é novamente utilizada em “Tá Chovendo Hambúrguer”. O que não chega a ser um demérito, já que o filme tem qualidades suficientes para agradar a adultos e crianças.

O Patinho Feio desta vez é o jovem Flint, garoto genial, metido a inventor, mas que nunca consegue acertar nas geringonças que constroi em seu laboratório. Entre elas, uma hilariante TV de controle remoto: você aperta o botão e o aparelho cria pernas e caminha em sua direção. A situação de Flint se torna ainda pior pelo fato dele morar numa ilha minúscula onde toda a população só come peixe, nada além de peixe (ótima metáfora para a mesmice do consumismo estilo Mcdonald´s).
E pior: seu pai quer que ele abandone as invenções e passe a ser seu companhero de trabalho…. vendendo peixes. Abatido, frustrado e com um enorme potencial represado, o jovem ainda tenta uma última invenção antes de se tornar um peixeiro: a máquina que transforma água em comida. Mas é óbvio que algo vai sair gigantescamente errado.

Mesmo partindo de uma premissa já exaustivamente explorada, o filme consegue se superar em outros quesitos cinematográficos que acabam lhe conferindo prerrogativas de uma deliciosa diversão em família. Os diretores Phill Lord e Chris Miller, ambos estreando no longa-metragem, injetam tamanha simpatia, personalidade e vivacidade aos personagens que a empatia com o público beira a perfeição. O ritmo também é dos mais ágeis, conquistando em cheio as plateias infantil e juvenil. E o humor – provavelmente a maior qualidade do desenho – é inteligente, afiado e constante, o que faz a alegria também dos espectadores adultos. Isso sem contar as bem dosadas doses de romance.

O traço, a qualidade da animação propriamente dita, é surpreendente, podendo inclusive ser comparada ao que existe de melhor no gênero. Leia-se Pixar. Os mais desavisados provavelmente não perceberão que a produção não é da Disney, nem da DreamWorks, nem da própria Pixar, mas sim da Sony, concorrente que corre por fora no segmento de desenho animado de longa-metragem. Embora seja preciso reconhecer que os personagens de “Tá Chovendo Hambúrguer” parecem descendentes diretos da família de super herois que vimos em “Os Incríveis”. Da Pixar.

Concorrências corporativas a parte, “Tá Chovendo Hambúrguer” é uma das melhores animações da safra recente. A lamentar somente a distribuidora não ter mantido a tradução do título original, “Cloudy With a Chance of Meatballs”, ou seja, “Nublado, com Possibilidades de Almôndegas”. É desagradável ver que as distribuidoras continuam sempre achando que o público não vai entender.